Por Carlos Newton

O clima no Planalto é de desespero. Os ministros Eliseu Padilha, Moreira Franco e Geddel Vieira Lima, do chamado “núcleo duro”, e o próprio presidente Michel Temer não sabem como proceder diante da crescente possibilidade de delação premiada do ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ). O presidente Temer deu ordem expressa para que ninguém fale sobre o assunto, mas não há como escapar. Na sexta-feira, ao participar de um evento em São Paulo, o ministro Eliseu Padilha, da Casa Civil, cercado pelos jornalistas, afirmou que uma eventual delação premiada do deputado cassado Eduardo Cunha “não está em pauta”. Foi a primeira vez que um ministro do governo se manifestou desde que o ex-presidente da Câmara dos Deputados foi preso, na quarta-feira, dia 19.

Desse jeito, Padilha se candidata ao troféu Piada do Ano, porque até as paredes do Planalto sabem que Eduardo Cunha passou meses se preparando para a delação premiada, reuniu documentos com auxílio do doleiro Lúcio Funaro, que também está preso, e até contratou o advogado Marlus Arns de Oliveira, renomado especialista que já fechou acordos de cooperação de empreiteiros da Camargo Côrrea e agora negocia a delação de Renato Duque, ex-diretor da Petrobras.

A PRIMEIRA VÍTIMA – O Planalto pode fingir que não está acontecendo nada, mas a verdade é que o tsunami armado por Eduardo Cunha não tarda a avançar sobre o Planalto Central, e a primeira vítima já está escolhida – chama-se Moreira Franco, que é hoje o braço-direito de Temer e provável substituto de Padilha na Casa Civil.

O ex-presidente da Câmara sabe que sua delação somente será aceita se trouxer “fatos novos” e não adianta apresentar denúncias contra os ex-presidentes Lula da Silva e Dilma Rousseff, porque a Odebrecht e a OAS brilhantemente já estão se desincumbindo dessa missão.

Portanto, só resta a Eduardo Cunha delatar seus ex-amigos do PMDB – Eliseu Padilha, Romero Jucá, Jader Barbalho, Renan Calheiros, Geddel Vieira Lima, Moreira Franco, Valdir Raupp, José Sarney, Edison Lobão, Sérgio Cabral, Eduardo Paes e muitos outros, entre os quais o próprio presidente Michel Temer. Além disso, Cunha tem farta munição contra importantes políticos de outros partidos, inclusive Gilberto Kassab, presidente do PSD e ministro do governo Temer, e Rodrigo Maia (DEM-RJ), atual presidente da Câmara. Vai ser um verdadeiro festival.

“BLINDAR” MOREIRA – No desespero, o presidente Temer já decidiu dar status de ministro a Moreira Franco, para blindá-lo com foro privilegiado no Supremo e evitar que caia nas mãos do juiz Sérgio Moro. Repete, assim, a manobra do então presidente Lula,  que em 2003 transformou o Banco Central em ministério para blindar Henrique Meirelles, que respondia a processos no Tribunal de Contas da União, conforme denunciei em 2003 na “Tribuna da Imprensa”.

A jogada de Lula deu certo, Meirelles não foi processado no Supremo e os crimes até prescreveram. Mas o mesmo golpe recentemente fracassou na tentativa da então presidente Dilma Rousseff, que tentou nomear Lula para a Casa Civil e agora está respondendo a processo por obstrução da Justiça, vejam como as coisas mudaram por aqui. E vão mudar ainda mais.

FORO PRIVILEGIADO – O fato concreto é que o foro privilegiado está com seus dias contados. Em breve, será revogado pelo próprio Congresso, devido à crescente pressão exercida pela opinião pública. Como dizia Ibsen Pinheiro, presidente da Câmara no impeachment de Fernando Collor em 1992, a Câmara vota o que povo quer. E o Senado, também.

Por isso, o presidente Temer, apesar de ser refém dos caciques do PMDB, não poderá vetar o fim do execrável foro privilegiado. Que assim seja.