Por Delfim Netto / Folha

A sociedade brasileira está em estado de choque. Apoiou fortemente o afastamento de Dilma, pelo “péssimo estado geral da sua obra”, reconhecido, aliás, por ela mesma quando, depois de sua reeleição, adotou o programa econômico do candidato vencido!

O seu impedimento está longe de ter sido um “golpe”. Fez-se dentro da Constituição (que acabou violada em seu benefício) e sob o “controle” do STF. A posse de Temer, em maio de 2016, mudou a perspectiva. Ele conseguiu aprovar no Congresso em um ano o que não se fez nos cinco do governo anterior. O problema é que os efeitos levam tempo para se materializar e não apagam o desastre fiscal em que fomos metidos no processo eleitoral. Em maio de 2017, a situação era ainda muito complicada, mas já apareciam tênues sinais de uma recuperação modesta do crescimento econômico, único remédio para nossas angústias.

ARMADILHA – Tragicamente, uma “delação premiada”, derivada de uma “armadilha” bem urdida somada à falta de desconfiômetro de Temer, produziu o tumulto que o país vive. Tal confusão é hoje o mais poderoso instrumento da oposição às “reformas”, que se localiza na alta burocracia federal, uma “elite extrativista” que se apropriou do poder em Brasília graças à covardia dos governos e ao descuidado conformismo escandaloso dos trabalhadores e dos sindicatos que a sustentam!

Na semana passada, tivemos outro “show midiático”, do mesmo “capoclasse” da organização criminosa que – com a conivência dos últimos poderes incumbentes – assaltou o patrimônio nacional e escafedeu-se brilhantemente. Aumentou a tensão, mas restaram terríveis contradições entre as suas narrativas, que certamente vão dar trabalho à Justiça.

INTRIGA CRIADORA – Estamos numa crise real enorme, apimentada por notícias transmitidas por imaginários informantes em “off”, que alimentam, em tempo contínuo, a “intriga criadora”. Parte da imprensa autopromoveu-se: de “técnicos de futebol” que sempre foram a “competentes jurisconsultos” que — sem dúvida nenhuma —”julgam” e “escracham” votos de ministros do TSE, STJ e STF, sem o menor respeito pelos seus conhecimentos e pela naturalidade do contraditório…

Como nos ensinou Max Weber (e lembrou o ilustre professor Kujawski), estamos diante do dilema: usar a ética da “convicção” (“faça-se justiça e pereça a sociedade) ou a ética da “responsabilidade” (avaliar cuidadosamente as prováveis consequências de cada solução e escolher a “menos pior” para a sociedade a curto e longo prazo). É essa escolha que está sob os ombros do STF, sacralizado como Poder moderador na Constituição de 1988. Que a razão e a precaução o iluminem. A paixão política costuma cobrar caro a sua imprevidência.