Por Kennedy Alencar

 

A ex-presidente Dilma Rousseff fez algumas críticas corretas ontem em um ato no Rio a respeito do aniversário de um ano do impeachment, votado pelo Senado em 31 de agosto de 2016. As elites econômicas do país são mesmo atrasadas e irresponsáveis, como afirmou a ex-presidente. O país desigual que temos é reflexo disso. Agora, por exemplo, numa grave crise fiscal, a elite privada rica resiste a pagar mais impostos. A elite do funcionalismo defende privilégios, como receber supersalários acima do teto constitucional. Os mais pobres pagam a maior parte da conta da crise econômica.

No entanto, a ex-presidente deveria lembrar a responsabilidade dela no retrocesso político, social, econômico, ambiental e em diversas áreas vivido pelo Brasil. Ela tem culpa por ter feito uma gestão econômica desastrosa e por não ter tido capacidade política de permanecer no poder.

Foram os erros de Dilma que permitiram a rebelião na base de apoio congressual, levando a um golpe parlamentar, que primeiro decidiu derrubá-la para depois buscar provas. Provas essas cuja consistência ainda hoje é fruto de debate no meio jurídico, as chamadas pedaladas fiscais. O STF (Supremo Tribunal Federal) até agora não julgou um recurso da defesa de Dilma que questiona a legalidade do impeachment. Passado um ano, já deveria ter dado essa resposta ao país.

O Brasil não era uma maravilha no governo Dilma. Pelo contrário. Ela permitiu a volta de uma inflação alta, jogou os juros na Lua, aumentou o desemprego e destruiu a política fiscal. Tampouco foi a presidente de esquerda que agora tenta aparentar. Sem mea culpa, perdem força as críticas de Dilma e do PT.

Os petistas e o ex-presidente Lula, aliás, permitiram a candidatura de Dilma à reeleição em 2014 quando tinham enorme crítica acumulada ao primeiro mandato dela. Ela fez a campanha eleitoral com um discurso e tentou governar com outro, agravando as dificuldades políticas que já tinha para se relacionar com o Congresso. Em 2015, perdeu a popularidade necessária para governar e resistir ao impeachment. No entanto, as demais forças políticas também têm responsabilidade pela crise. O retrocesso vivido pelo Brasil em diversas áreas é uma construção da atual classe política, não apenas do PT. O PSDB, maior partido de oposição aos governos petistas, não aceitou o resultado eleitoral de 2014 e apostou na desestabilização do governo.

A intolerância no debate público e o crescimento da extrema-direita no Brasil têm participação decisiva do PSDB. Os tucanos perderam espaço para a extrema-direita _basta olhar as pesquisas eleitorais para constatar isso. A ala liderada pelo senador Aécio Neves, que perdeu nas urnas e logo em seguida contestou o resultado na Justiça Eleitoral, aliou-se ao então presidente da Câmara, o peemedebista Eduardo Cunha, em 2015, para dinamitar as medidas econômicas do governo. Houve o festival da “pauta bomba”.

Depois, o PSDB deu aval ao impeachment. Só assim o PMDB chegou ao poder. Apesar da queda da inflação e dos juros, o presidente Michel Temer e a equipe econômica erraram ao optar por um ajuste fiscal gradual e com maior peso sobre os mais pobres. Faz três anos que o país só adota o receituário da austeridade, desde Joaquim Levy. Ninguém aguenta.

Meirelles e seu time dos sonhos agravaram a crise fiscal, expandindo metas deficitárias que dificilmente serão cumpridas. Não cobraram impostos dos mais ricos quanto tinham capital político para adotar essa medida e recuperar parte da capacidade fiscal do país. A política de desoneração de Dilma, tão criticada hoje, foi um pedido da Fiesp e dos grandes empresários brasileiros. Solicitaram pagar menos impostos em nome da geração de emprego.

A equipe econômica de Meirelles não retirou esse benefício quando tinha força para fazê-lo. Hoje pena no Congresso. A reforma da Previdência ficou na gaveta de propósito e ganhou um contorno social que pune os mais pobres. Veio a delação da JBS, atropelando as chances dessa reforma.

Portanto, a classe política como um todo tem responsabilidade pela crise brasileira. A saída passa por um debate público mais responsável e menos populista, pelo sacrifício dos setores mais privilegiados do país e por uma política que permita a volta do crescimento da economia.