Por Vicente Nunes / Correio Braziliense

Ainda que, gradualmente, governo e mercado elevem as projeções de crescimento para este ano e para 2018, há muitas dúvidas no horizonte sobre o tamanho da retomada da economia. Não se sabe até aonde vai a força do consumo das famílias, que vem sustentando o Produto Interno Bruto (PIB), e qual a real disposição do empresariado em retirar os projetos de investimentos das gavetas. O discurso do Palácio do Planalto de que o país pode registrar um salto de 3% ou mais no ano que vem está dentro do roteiro traçado por um governo que precisa, desesperadamente, de boas notícias. Mas há um longo caminho a ser percorrido, com uma grande incógnita a atormentar os donos do dinheiro: as eleições presidenciais.

Os ajustes para cima nas projeções do PIB indicam que o período mais dramático para a economia, felizmente, ficou para trás. Na pesquisa semanal realizada pelo Banco Central, as estimativas de crescimento neste ano subiram de 0,60% para 0,68%. No caso de 2018, passaram de 2,20% para 2,30%.

AINDA HÁ RISCO – Na situação em que o governo se encontra, com uma nova denúncia contra o presidente Michel Temer tramitando na Câmara dos Deputados, tais previsões são mais do que um alívio. Sustentam a visão de que, independentemente da gravidade da crise política, o Brasil está caminhando e corrigindo as sérias distorções criadas na administração de Dilma Rousseff.

O risco, porém, de haver frustração em relação ao PIB é considerável. A depender do desenrolar das eleições presidenciais, o crescimento que hoje é motivo de comemoração pode levar um tranco. Os dois nomes que lideram as pesquisas de intenção de voto, Lula e Jair Bolsonaro, são rechaçados pelos investidores. Mesmo que o petista fique fora da disputa, a falta de um nome de consenso levará a uma polarização só vista em 1989. Com pouco mais de 10% dos votos válidos, um dos candidatos poderá ir para o segundo turno. É muita incerteza para quem pensa a longo prazo.

EFEITO DO FGTS – Os números coletados até agora indicam que boa parte do consumo das famílias que vem sustentando o PIB decorreu dos saques das contas inativas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Esse efeito na demanda, no entanto, praticamente se esgotou. A aposta, agora, é de que a conjugação de inflação e juros em queda faça o trabalho de sustentar a atividade de forma equilibrada e por um longo período. Nesse quesito, o consenso é grande. Mas, para que o PIB realmente deslanche, será importante a volta dos investimentos produtivos. E esses se mantêm muito arredios.

Já vestindo o figurino de candidato, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, tenta inflar o otimismo, até porque conta com o trunfo da economia para se viabilizar nas urnas. Em viagem ao exterior, brada em alto e bom som que, por onde vem passando, tem colhido depoimentos de empresas que estão prontas para aportar capital no Brasil.

DISTÂNCIA ENORME – Entre desejo e realidade, contudo, há uma distância enorme. Não há dúvidas de que o país tem um grande potencial para crescer e carece de investimentos em vários setores, sobretudo em infraestrutura. Mas como aproveitar as oportunidades se não se sabe quem estará sentado na principal cadeira do Planalto a partir de 2019? Essa é a indagação que atormenta a todos.

Os céticos quanto a uma retomada mais forte da economia acreditam que a frustração com o crescimento tenderá a se materializar no quarto trimestre do ano, justamente quando Meirelles diz que ocorrerá o grande salto do PIB. Para esse grupo, nem mesmo a inflação abaixo de 3%, o piso da meta fixada em lei, e a expressiva redução dos juros — desde outubro de 2016, a taxa básica (Selic) caiu seis pontos percentuais, de 14,25% para 8,25%, podendo chegar a 7% — serão capazes de impulsionar o consumo na velocidade que o governo deseja e precisa para manter o discurso otimista.

TRABALHO SUJO – Independentemente da perspectiva de frustração com o crescimento, é preciso ressaltar, na visão do economista Carlos Eduardo de Freitas, ex-diretor do Banco Central, que as expectativas de inflação estão controladas pelo menos até 2020, ficando abaixo do centro da meta, de 4,5%. “É isso que está permitindo ao BC cortar tanto os juros e levá-los, ao longo do tempo, para 7% ou menos”, afirma. A sensação de melhora no bem-estar, ressalta, é visível, principalmente por causa da significativa queda dos preços dos alimentos.

Freitas lembra que parcela expressiva do trabalho sujo para que a inflação e os juros pudessem cair foi realizado por Joaquim Levy no comando do Ministério da Fazenda do governo Dilma. O então ministro corrigiu os preços dos combustíveis e da energia elétrica. Isso levou o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) para quase 11% em 2015.

PERIGO LATENTE – Com a mudança de governo e a credibilidade dada à equipe econômica, foi possível fazer uma política monetária mais flexível sem correr o risco de volta da inflação.

“É preciso deixar claro que ainda há muito por fazer. A taxa real de juros, que desconta a inflação projetada para 12 meses à frente, está alta, próxima de 5%. O desemprego continua elevado e o problema fiscal não foi resolvido. Mas demos passos importantes”, destaca o ex-diretor do BC. Resta torcer, no entender de Freitas, para que as eleições que estão a caminho não tirem o país da rota de ajustes e de reformas importantes como a da Previdência Social. Esse perigo é latente. E não podemos fechar os olhos para ele.