Em reunião com ministros e líderes governistas, Michel Temer tropeçou no óbvio ao reconhecer, no início da noite desta segunda-feira (6), que a reforma da Previdência pode naufragar: “Se num dado momento a sociedade não quer a reforma da Previdência, a mídia não quer a reforma da Previdência e a combate e, naturalmente, o Parlamento, que ecoa as vozes da sociedade, não quiser aprová-la, paciência. Eu continuarei a trabalhar por ela.”

O mesmo Temer autorizara a divulgação de uma propaganda, pendurada horas antes na conta do governo no Twitter, que destoava do clima de caída de ficha da reunião noturna. “Fizemos do limão, limonada”, anota o texto que convida o internauta a assistir à peça. “A economia melhorou. Os empregos voltaram. Estamos de volta ao jogo.”

Recorrendo a um expediente manjado entre os maquiadores de imagem, a publicidade exibe cenas de torcedores nas arquibancadas. Sem citar Dilma Rousseff, a peça faz alusão à ruina que marcou a fase pré-impeachment: inflação de dois dígitos, assalto à Petrobras, desemprego lunar, juros escorchantes, o país “parado, desacreditado e desmoralizado”. Ao fundo, torcedores que pareciam sofrer as dores da derrota por 7 a 1 que o Brasil sofreu da Alemanha na Copa de 2014.

Súbito, aparecem no vídeo frases e imagens de deixar corado Lourival Fontes, o chefe do Departamento de Imprensa e Propaganda do Estado Novo, criador da expressão “pai dos pobres.” A batucada, que soava lenta, acelerou. Os torcedores amargurados foram substituídos por brasileiros eufóricos. “Mas aqui é Brasil”, diz a peça. “Viramos esse jogo”.

Nesta segunda, Temer foi assertivo ao dizer quer a responsabilidade pela reforma deve ser compartilhada com o Congresso. Ele jogou para os deputados o peso de uma possível derrota. “[Se] o Parlamento, que ecoa as vozes da sociedade, também não quiser aprová-la, paciência.”

Ao falar ontem na abertura de reunião com líderes da Câmara, Temer admitiu publicamente que a reforma pode não ser votada, mas disse que isso não inviabiliza o governo.

“Não é uma derrota eventual ou a não votação que inviabiliza o governo, porque o governo já se fez, já foi feito e continuará a ser feito.”

Em conversas com aliados no fim de semana, o presidente constatou que o debate sobre as novas regras de aposentadoria chegou a uma encruzilhada: a pouco mais de um mês do fim do ano legislativo, o Planalto não conseguiu angariar os 308 votos necessários na Câmara para aprovar a medida e considera que o assunto ficará interditado com as pressões eleitorais de 2018.

Folha de São Paulo