Os brasileiros que andam céticos sobre o futuro ganharam de presente nos últimos dias do ano duas histórias que fazem pensar no que ainda dá certo no país.

Mesmo quem nunca tinha prestado atenção na cantora Anitta pôde perceber como ela foi longe. Aos 24 anos, rebolando numa favela carioca com um biquíni de fita isolante, sem vergonha de expor as imperfeições do próprio corpo, ela atraiu a atenção de milhões de pessoas para o clipe de sua nova música na internet.

Na véspera do Natal, “Vai Malandra” estava entre as 20 canções mais ouvidas no mundo pelos usuários de um dos principais serviços de música por assinatura da rede. Foi a primeira vez que uma artista brasileira apareceu tão bem no ranking.

Dias depois da estreia do clipe de Anitta, noticiou-se que a americana Boeing quer comprar a Embraer, a indústria brasileira que lidera o mercado mundial de jatos para aviação regional. Além do êxito comercial dos aviões, que podem ajudar a Boeing na competição com sua rival Airbus, os americanos estão de olho no intelecto dos engenheiros brasileiros.

As ações da Embraer dispararam com a expectativa criada pela notícia. Privatizada há mais de duas décadas, a companhia hoje tem investidores do mundo inteiro como sócios e viu seu valor de mercado aumentar 26% de um dia para o outro.

Há um traço comum nas trajetórias de Anitta e da Embraer. A cantora conquistou o mundo ao se associar a produtores e artistas internacionais que ampliaram sua visibilidade. A fabricante de aviões cresceu aliando-se a fornecedores estrangeiros que a ajudaram a absorver tecnologia e desenvolver novos produtos.

Anitta incomoda as feministas, os puristas da língua e a polícia dos costumes. O avanço da Boeing sobre a joia da coroa da indústria nacional assustou os nacionalistas, que ameaçam barrar a transação. Talvez tenha chegado a hora de os críticos deixarem de lado os preconceitos para tentar entender a lição da malandra.

Por Ricardo Balthazar – Folha de S.Paulo