Pedro do Coutto

Os jornais e as emissoras de televisão têm assinalado um elevado grau de indefinição da eleitoras no que se relaciona com a sucessão presidencial. Com base em pesquisas tanto do Ibope quanto do Datafolha, essa indefinição está na altura de 80%, muito maior que a indefinição registrada pelos eleitores masculinos até agora. Ontem mesmo , em sua coluna em O Globo, o jornalista Zuenir Ventura focaliza o tema. O fenômeno merece um estudo e uma observação mais transparente.

A diferença da disposição dos homens e das mulheres em relação ao voto constitui um fato inédito ao longo de mais de 50 anos de campanhas eleitorais. Surpresa? Sim, porque se a indefinição se mantiver, será a primeira vez que ela marca um pleito desde 1945 até hoje. Podem perguntar ao diretor do Datafolha, Mauro Paulino, e ao presidente do Ibope, Carlos Alberto Montenegro, se há precedente, se numa eleição as mulheres se abstiveram muito mais que os homens.

SEM REPRESENTAÇÃO – A indecisão que está preocupando as mulheres decorre do fato de não se sentirem ainda representada através da voz dos candidatos e mesmo das candidatas envolvidas no processo político. Um dado importante, acho eu, que deveria ser objeto de uma pesquisa destinada a esclarecer os dirigentes partidários. O resultado, mais amplo possível poderá balizar as mensagens políticas, indo ao encontro das reivindicações da população feminina de modo geral.

Trata-se de ouvir a voz das eleitoras e Incorporar os anseios às plataforma das diversas legendas do país. São 35 partidos e 52% do eleitorado brasileiro. Em consequência, a diferença de eleitoras em relação aos eleitores vai de 52 a 48%. É hora, portanto de os partidos, através das campanhas de seus candidatos, fazerem se representar no universo do voto.

UMA SURPRESA – Para mim, é uma surpresa a indefinição que vem sendo destacada, porque até hoje acompanhando eleições verifiquei que nunca houve divergência entre o eleitorado masculino e o feminino no cômputo final dos votos. As diferenças ocorrem entre as classes sociais contrapondo as de maior renda e as de menor remuneração.

Inclusive as pesquisas eleitorais, todas elas, partem da divisão do eleitorado com base nos segmentos econômicos da sociedade. Por isso, vale destacar que os candidatos ou candidatas dos grupos de renda mais alta tendem a decidir mais prontamente quais as suas preferências.

As classes pobres custam mais a se decidir, por esse fato é que ocorrem mudanças nas pesquisas eleitorais, de acordo com o estágio das campanhas. Às vezes, um candidato de maior força nas classes média e alta larga na frente,, enquanto os candidatos de preferência dos outros grupos sociais crescem no final do processo – em muitos casos, na véspera das urnas. Trata-se de uma corrida de longa distância, daí as mutações que vez por outra acontecem.

OUTROS EXEMPLOS – Há casos, entretanto, em que o candidato preferido pelas classes de renda mais alta consegue penetrar de alguma forma mais sensível nos outros grupos. Caso, por exemplo, de Fernando Henrique Cardoso nas sucessões de 1994 e 1998. No outro lado do avesso, podemos citar Lula em 2002, quando arrebatou o eleitorado de menor renda e conseguiu sensibilizar uma fração do outro lado do espelho.

As considerações que faço sobre o voto estão restritas às eleições majoritárias. Porque nas disputas proporcionais, como é o caso dos deputados federais e estaduais, a lógica da divisão por classe torna-se pouco nítida. Isso porque existe a questão dos redutos eleitorais sobre os quais muitos candidatos detêm o controle, à base de atendimentos comunitários. Esses atendimentos, na verdade, preenchem vazios deixados pelas administrações estaduais e regionais. Não se pode exigir de quem tem recursos mínimos para viver uma capacidade de escolha que não se baseie numa ação paroquial.

Vamos, assim, para mais um desfecho dos muitos que tenho assistido ao longo do tempo de 1945 até hoje.  No final da ópera vamos conferir o voto colocado nas urnas sem distinção de sexo. O nexo entre os diferentes lados, tenho certeza, surgirá nos resultados finais de mais essa eleição.