Por Mathias Alencastro / Folha

A cúpula do G20, em junho, tinha sido um pesadelo para Emmanuel Macron. Isolado e diminuído, ele parecia incapaz de impedir os ataques dos governantes iliberais à ordem internacional. Algo urgente tinha de ser feito. Às vésperas do brexit, ponto de virada da nova era dos extremos, a França não podia perder o controle da narrativa.

Na tentativa de quebrar a polarização entre democracias liberais e regimes iliberais, Macron tentou, nas semanas que separaram a cimeira do G20 em Osaka e a do G7 em Biarritz, abrir um canal de comunicação com Jair Bolsonaro e reatar diplomaticamente com Vladimir Putin.

JOGADA DE MESTRE – O primeiro, como todos sabemos, preferiu cortar o cabelo e fazer live nas redes sociais. O segundo topou se deslocar ao forte de Bregançon, residência oficial da presidência francesa. O presidente francês tirou lições do comportamento dos demais governantes e, na primeira oportunidade, passou o recibo com uma jogada de mestre na arena diplomática.

Por um lado, Macron decidiu intervir a favor do regresso da Rússia ao G7, uma exigência de Putin, e ignorou ostensivamente os incêndios em curso na Sibéria.

Por outro, o presidente francês mobilizou seus aliados políticos, econômicos e sociais, designou os incêndios na Amazônia como emergência mundial e elevou Bolsonaro, que o tinha humilhado algumas semanas atrás, a pária.

PRÓXIMO PASSO – Em uma semana, Macron conseguiu se reaproximar de seu principal e mais perigoso antagonista, que acusava de interferir nas eleições francesas, sem perder as suas credenciais ambientais e democráticas. Tudo isso graças à inabilidade diplomática do presidente brasileiro, o melhor inimigo que se pode desejar.

A próxima jogada do Macron, durante a reunião do G7, pode ter consequências ainda mais devastadoras para o governo brasileiro.

Ele vai colocar como condição para o regresso da Rússia à cúpula das sete principais economias do mundo a punição exemplar do governo brasileiro. Ou seja, Trump terá de escolher entre Putin e Bolsonaro na mesa de negociações.

OSTRACISMO – Se o presidente americano optar por proteger os interesses do presidente russo, Bolsonaro estaria perto da sua primeira grande conquista internacional: o título de primeiro chefe de Estado a ser ostracizado pela sua política ambiental.

Numa improvável ironia, Bolsonaro, que apostou tudo na relação com os Estados Unidos, pode acabar sendo rifado por Trump na próxima cimeira global.