Por Carlos Newton

É impressionante como avança o impeachment de Jair Bolsonaro, que se encarrega pessoalmente de inflar as velas do processo, ao atribuir sua derrocada política à Imprensa, ao Congresso Nacional e ao Supremo Tribunal Federal, não necessariamente nesta ordem. É impressionante sua imaturidade política, sempre imersa nas mais estranhas teorias conspiratórias, alimentadas pelos filhos, que se orientam com aquele guru virginiano, que nem mesmo com a experiência de astrólogo conseguiu entender que a Terra é redonda, assim como os demais planetas e seus satélites.

A cabeça de Bolsonaro, porém, é absolutamente quadrada. Mesmo assim, ele conseguiu se transformar num extraordinário fenômeno político, ao vencer uma eleição presidencial praticamente sem dinheiro, sem horário no rádio e TV e sem partido político sustentável.

TODAS AS CONDIÇÕES – Com a confiança e o apoio dos militares, Jair Bolsonaro tinha todas as condições para fazer um grande governo. Mas desde o início foi uma tragédia, não somente na política interna, mas também na externa.

Atirou-se vergonhosamente aos pés do presidente norte-americano Donald Trump e do primeiro-ministro israelense Benjamin Netaniahu, ao mesmo tempo em que criava graves problemas com Venezuela, Argentina, China, França, Alemanha e países árabes em geral.

Investido em uma soberba inexpugnável, aos poucos foi perdendo importantes aliados, como Rodrigo Maia, Davi Alcolumbre e Dias Toffoli, que chegaram a fechar com ele um falso pacto federativo, cujo objetivo era inviabilizar a Lava Jato, garantir a impunidade das elites empresarias e políticas, que incluíam os três filhos rachadistas.

NO MELHOR DOS MUNDOS – O pacto funcionou, os ministros do Supremo e suas mulheres, assim como os filhos de Bolsonaro e as elites políticas e empresariais, todos ficaram blindados contra investigações do Coaf, o famoso Pacote Anticrime do ministro Sérgio Moro foi desidratado no Congresso, enquanto o Supremo acabava com a prisão após segunda instância, libertando Lula da Silva, José Dirceu e o resto da gang. Tudo ia bem, Bolsonaro estava vivendo no melhor dos mundos imaginado por Voltaire.

De repente, porém, prevaleceu uma expressão bíblica dos Eclesiastes – “Vanitas vanitatum et omnia vanitas” (Vaidade das vaidades, tudo é vaidade), e Bolsonaro virou o jogo. Afinal, por que dividir o poder, se poderia exercê-lo sozinho?

A essa altura, Bolsonaro já tinha se livrado do inoportuno PSL e estava criando seu próprio partido, tendo rompido com vários políticos que o apoiaram na eleição. Mas o pior foi ir se isolando, ao prestigiar manifestações contra o Congresso e o Supremo, para demonstrar que não precisava de mais ninguém.

DELÍRIO ISOLACIONISTA – Insuflado pelo puxa-saquismo familiar e institucional que hoje caracteriza o Planalto, entrou num delírio isolacionista, a partir do princípio de que minha caneta é mais importante do que a tua, uma tremenda ilusão que já não existe na política desde os tempos do Barão de Montesquieu (1689-1755), vejam como Bolsonaro e seus conselheiros são verdadeiramente tapados, como se dizia antigamente.

Foi se incompatibilizando com os antigos aliados e passou a alimentar a esperança de ser aclamado pelo povo e pelas Forças Armadas como Bolsonaro primeiro e único, sem perceber que o povo não tem poder algum e os militares já não o apoiam mais como antigamente, muito pelo contrário.

Com a demissão do ministro Sérgio Moro, o castelo está prestes a desmoronar. A liminar acolhida pelo relator Alexandre de Moraes é clara. Indica que Moro saiu porque não aceitou obstrução da Justiça, um dos piores crimes de responsabilidade. O próprio Bolsonaro, ao responder a Moro, já tinha confessado sua pretensão, que tentou concretizar ao nomear um amigo dos filhos para dirigir a Polícia Federal. É o começo do fim.