A VERDADEIRA FACE DA RENÚNCIA PAPAL

 

 

Para se tornar papa, o candidato deve ter um bom currículo acadêmico, carreira em altos cargos da igreja e boa capacidade de agregar interesses de diversos grupos, principalmente, a Cúria Romana. Caso queira ser diferente, com ideias que abalem as estruturas tortas por trás dos muros ditos santos pelos católicos, não se elegerá jamais. Portanto, trata-se de uma eleição onde o espírito santo passa longe, pois este não deve coadunar com as imundícies reconhecidas até pelo o último papa. Enquanto Cardeal, Joseph Ratzinger escreveu para a sexta feira santa de 2005, durante a IX estação da via sacra, um documento que todos podem consultar no próprio site do vaticano, intitulado de “Quanta sujeira há na Igreja”. Neste, ele afirma em um trecho que “quanta sujeira há na Igreja e precisamente entre aqueles que, no sacerdócio, deveriam pertencer completamente a Ele! Quanta soberba, quanta auto-suficiência!”

É impressionante como uma renúncia virou motivo de júbilo entre os fiéis e não de indagações. Será que ninguém quer pensar? É medo de se deparar com uma verdade não escondida, a qual abalaria a crença de talvez toda uma vida? Porque não se quer conhecer a história na mais pura realidade?.

Quando se fala nesses termos, uma multidão de fiéis ofendidos com o que chamam de “ataque” e “desrespeito” por parte de quem vê os fatos à luz do sol e não enevoados com as frágeis explicações do baixo e alto clero, os quais são sabedores profundos dos reais motivos que levaram os papas Ponciano (235), Silvério (537), João XVIII (1009), Bento IX (1045 reposto em 1047), Celestino V (1294), Gregório XII (1415) e agora Bento XVI a renunciarem. Todos tiveram motivos que nada estão relacionados à saúde ou coisas do gênero. Todos tiveram conspirações ou foram obrigados por circunstâncias limítrofes para fazê-lo. Existiram além das renúncias eventos no mínimo estranhos com papas. Dentre os mais comentados sem nenhum mérito de bom grado está o Alexandre VI, da família Bórgia.

A Igreja Católica e, digamos com certo eufemismo, alguns papas foram “tortos”. Caso tenha havido algum papa santo, sem dúvida foi nos primórdios do cristianismo ou foi isolado de alguma maneira. Temos na história do papado uma grande variedade de homens que ocuparam de fato a cátedra de Pedro: guerreiros e pacificadores, santos talvez e salafrários, políticos e pastores, reformadores e nepotistas, sem distinção. Pensa-se que as mazelas da Igreja ficaram no passado, mas não, elas estão vivas e agindo. Não enxerga quem não lê, e quem lê, não crê de tolo. O brilhante autor Richard McBrien em seu livro onde o tema é a história de todos os pontificados até João Paulo II relata dentre tantas discórdias a que aconteceu com o Papa Estevão I (254-257), 23° Papa na lista do vaticano e primeiro a apelar o título de Pedro utilizando-se de Mateus 16:18 (“… tu és Pedro…”).  Nesse contexto o autor discorre sobre o que já ocorria na Igreja em tempos remotos: “… Estevão I, como “São Pedro”, antes dele, enfrentar, por assim dizer, outros bispos (não haviam os cardeais na época) e é diretamente acusado de pôr em perigo a unidade da Igreja”. Alguma semelhança com as reais possibilidades da renúncia do papa atual ?.

O “pobre” do Bento de XVI, nos últimos tempos, conviveu com um governo paralelo e cometeu o infortúnio de desejar entender a máquina administrativa fora dos papéis que lhes eram dados a assinar. Dessa tomada de informações se deve o roubo de documentos que atestavam que o “vigário de Cristo” estava tomando ciência da atual rotina de falcatruas no Instituto de Obras Religiosas (Banco do Vaticano). Esse tipo de “suspeita” certeza sempre existiu e incomoda aos papas contemporâneos. O mais famoso deles foi João Paulo I que quis fazer uma devassa na corrupção implantada pela Opus Dei e outras organizações não menos secretas no Vaticano e acabou morto, com fortes indícios de envenenamento. João Paulo II também quis seguir os planos do antecessor e veio um turco querer matá-lo. Será que iriam querer matar o João de Deus tão amado por absolutamente nenhuma razão “papável”?.

No atual caso as represálias foram para todos os sabedores e interessados. O cardeal Vigano, vice-governador da cidade do Vaticano na época, que trocava cartas com o papa sobre o assunto foi transferido para os Estados Unidos e o Bento depois de tanta pressão, pede a renúncia alegando problemas de saúde normais para um homem na sua idade. Como de Saúde? E todos os papas não deixam de ser papas por mortes naturais oriundas de enfermidades?. Ele acabou assumindo o risco de uma “decapitação” de sua história que poderia ser mais positiva se tivesse desmantelado para o mundo a banda podre da Igreja. Por sua vez, como ser humano comum e que tem medo, foi inteligente e santo para com ele mesmo e não se tornou mártir dessa mancomunada sordidez.

O próprio, enquanto jovem Joseph Ratzinger, poderia já ter sido mártir se tivesse agido e renegado a seguir Hitler não assumindo posto na juventude Hitlerista, pois esse seria o papel proposto por Cristo e de muitos santos de não seguir o sistema apenas por que era obrigado, pois se tratava de ser membro do grupo assassino mais atroz da história da humanidade.

A renúncia maquiada fez o Bento contribui para aguçar a divisão de poderes na instituição, pois ele ainda possui aliados. O próprio irá opinar, com grande influência, a escolha de seu sucessor. Provavelmente os católicos já possuem um novo papa. O conclave, remota os fatos em algumas oportunidades, apenas foi uma peça teatral para o mundo e multidão fervorosa na praça de São Pedro. Podemos estar de novo nesse cenário.

A Igreja de dois mil anos pode estar a caminho do desmoronamento material e moral. A renúncia coloca em xeque a premissa do primado papal e a forma como o ministério outorgado como Petrino (de Pedro) é visto, haja vista, abrir precedente no papado moderno a se tornar prática comum. Jesus não ensinou a renunciar sob pressões. Era Pilatos forçando a ele dizer o contrário e ele firme na fé. Não posso, assim, ver o Papa como o vigário de quem o papado não faz de exemplo.

Por fim, a imprensa, em sua maioria, divulga o que a Igreja quer ouvir. Os padres na ponta criam facetas de heroísmo no ato da renúncia.  Foi a primeira vez que ouço falar em renúncia como ato heroíco, pois sempre vi e li atos dessa estirpe como obrigados por uma determinada situação e vergonhosa para quem a procede.

Colaborador: Rogério Roger