Daniel Carvalho / Folha

Na semana em que o Centrão rachou com a debandada de DEM e MDB, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) intensificou o corpo a corpo com parlamentares. Recebeu deputados para sanção de lei e oração, inaugurou obras ao lado de integrantes do Congresso e fez afagos ao Legislativo.

“Hoje tive uma viagem ao Nordeste com um grupo de parlamentares”, disse Bolsonaro em sua live na quinta-feira, dia 30, após retornar de um périplo por Bahia e Piauí horas antes. “Elogiei o Parlamento também. Tem votado muita coisa econômica. Temos começado a engrenar com o Congresso”, disse Bolsonaro, que nesta sexta-feira, dia 31, foi a Bagé (RS), mais uma vez acompanhado de parlamentares.

VIAGEM – Na cidade gaúcha, Bolsonaro disse querer sair de Brasília uma vez por semana. Na semana que vem, ele afirmou que gostaria de ir ao Vale do Ribeira, em São Paulo, mas o plano deve ser adiado, já que a região voltou para a fase vermelha por causa do aumento do número de casos do novo coronavírus. Um dos acompanhantes de Bolsonaro na quinta foi o senador Ciro Nogueira (PI), presidente do Progressistas (ex-PP), partido que comanda o Centrão.

A disputa pela sucessão de Rodrigo Maia (DEM-RJ) no comando da Câmara tem potencial para implodir a tentativa do Palácio do Planalto de formar maioria na Casa para aprovar projetos de seu interesse e para barrar um eventual processo de impeachment de Bolsonaro.Desde a prisão do policial militar aposentado Fabrício Queiroz, amigo do presidente e ex-assessor do hoje senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), o Executivo tenta costurar uma rede de proteção no Legislativo para blindar Bolsonaro.

TOMA LÁ DÁ CÁ – Inicialmente, Bolsonaro negociava cargos de segundo e terceiro escalão para que as principais siglas do Centrão —Progressistas, PL (ex-PR) e Republicanos (ex-PRB)— os distribuíssem aos demais partidos. Mas, depois, o presidente passou a dialogar diretamente com bancadas menores, como a do PSC, e a receber deputados em almoços no Planalto organizados pelo deputado Fábio Ramalho (MDB-MG), cujo perfil agregador é largamente conhecido no Congresso.

O trabalho de articulação do chefe do Executivo foi interrompido pelo diagnóstico positivo de Covid-19, que interrompeu encontros pessoais e o roteiro de viagens que pretendia fazer a pedido dos parlamentares, que queriam faturar politicamente ao aparecer ao lado do presidente em suas bases eleitorais.

NOME DE CONFIANÇA – O Planalto via no deputado Arthur Lira (PP-AL), líder do blocão —que reúne diversos partidos, inclusive do Centrão—, um nome de confiança para aglutinar uma base sólida que garantisse a Bolsonaro ao menos 172 votos (um terço mais um) necessários para barrar um eventual pedido de impeachment contra ele.

Porém, para se afastar do governo, DEM e MDB decidiram desembarcar desse grupo, que hoje reúne formalmente nove legendas e 221 parlamentares. Em seguida, começaram a surgir na agenda oficial de Bolsonaro nomes de deputados até mesmo para atos corriqueiros. Na terça-feira, dia 28, o presidente recebeu a deputada Flávia Arruda (PL-DF) para que ela acompanhasse a sanção de uma lei originária de um projeto da parlamentar sobre o resgate de R$1,5 bilhão do Fundo Nacional da Assistência Social.

“Semana passada eu procurei o ministro Jorge [Oliveira, da Secretaria-Geral]. Na sexta (24) ele me mandou mensagem e ontem [segunda-feira, 27] o Planalto me chamou”, disse Arruda.Logo depois, foi a vez do deputado Cezinha de Madureira (PSD-SP) ingressar no gabinete de Bolsonaro.

ORAÇÃO – “Somos base do governo, base do presidente. Sempre que podemos, estamos juntos. Fui lá orar por ele. Sempre que podemos, nós, da bancada evangélica, estamos juntos, dialogando”, disse Madureira. “O presidente está muito bem. Da forma que ele está agindo, está muito bem, trazendo paz.”

Quem também esteve com Bolsonaro nesta semana foi o deputado Domingos Neto (PSD-CE), coordenador da bancada de seu estado, que elogiou a “postura de pacificação e também de olhar para o Nordeste”.

Na articulação do governo, a avaliação é, segundo um auxiliar do Planalto, de que o presidente se deu conta há pouco tempo que não adianta ficar em choque com o Congresso e que a política é feita de pequenos gestos, como os que Bolsonaro passou a fazer ao se aproximar de parlamentares.

BOMBEIRO – A articulação política do Planalto está a cargo do ministro Luiz Eduardo Ramos, titular da Secretaria de Governo. Mas um outro ministro também tem ajudado no trabalho de aproximação entre Executivo e Legislativo. Ainda como deputado, antes de assumir o Ministério das Comunicações, Fábio Faria já atuava como bombeiro e na construção da ponte entre os dois Poderes.

No ministério, dedica boa parte de sua agenda a receber parlamentares. De segunda a quinta-feira, de 30 compromissos divulgados, 14 envolviam deputados e senadores.

“O Fábio Faria é ministro do governo e tem que jogar para o governo. Ele é um sujeito muito habilidoso, faz ponte com todo mundo, é um articulador nato. Ele quer ajudar o governo, não significa que a articulação é dele. Todo ministro deveria fazer isso”, disse Cezinha de Madureira, que visitou Faria antes do encontro com Bolsonaro.