Por Antonio Magalhães*

O ano de 2020 – que acaba hoje – foi uma soma de erros, equívocos e má fé, resultando em acontecimentos trágicos e fatais. Os horóscopos e índices de numerologia – para quem acredita – falharam todos. Os ditadores, políticos, especialistas em imunologia – verdadeiros e falsos – também se equivocaram ao não identificar a dimensão da pandemia do vírus chinês, expresso pela gripe Covid-19. Ou pior, por má fé, a superdimensionaram para favorecer interesses políticos.

Desde o início do ano, o planeta mergulhou no caos por conta da disseminação do coronavírus a partir da China. Até hoje, 31 de dezembro, contabiliza mais de um milhão de mortos e a economia global em frangalhos. A perspectiva da imunização pelas vacinas contra a Covid alivia a tensão de humanos sofridos, mas não se sabe até agora  como elas se comportarão nessa aplicação massiva que deve se estender por todo 2021.

Vivemos um ano com medo. Medo de morrer, de ver parentes queridos contaminados mortalmente pelo vírus, temerosos da falência financeira doméstica e nacional, sabendo-se vigiados por vizinhos, colegas, câmeras localizadoras, celulares grampeados para proibir o ir e vir. Enfim, um ano de náuseas.

O filósofo polonês Zygmunt Bauman comenta sobre como temos sido submetidos a um inventário de perigos constantemente renovados: “por toda parte, houve um aumento das advertências globais. A cada dia surgiam novas advertências globais sobre vírus assassinos, ondas assassinas, drogas assassinas, icebergs assassinos, carne assassina, vacinas assassinas, assassinos assassinos e outras possíveis causas de morte iminente”.

“O homem contemporâneo é bombardeado pelo alardeamento constante de que o mundo é um lugar perigoso. Independentemente da efetiva letalidade dessas inúmeras ameaças (bugs do milênio, ácaros de tapete, vítimas da doença da vaca louca, fatalidades por causa de alimentos geneticamente modificados, atos terroristas, balas perdidas), elas são tantas, tão disseminadas e tão pouco controláveis por nós que, na ocasião em que nos defrontamos com uma fonte explícita do medo, experimentamos um tipo de alívio que sucede ao desconforto e à ansiedade de não se reconhecer o perigo real”, explica Bauman.

“O medo é mais assustador quando difuso, disperso, indistinto, desvinculado, desancorado, flutuante, sem endereço nem motivo claros; quando nos assombra sem que haja uma explicação visível, quando a ameaça que devemos temer pode ser vislumbrada em toda parte, mas em lugar algum se pode vê-la. “Medo” é o nome que damos a nossa incerteza: nossa ignorância da ameaça e do que deve ser feito (…)”, completa Bauman.

E ficamos assim: com medo do desconhecido, do invisível, do mal que pode vir de qualquer lado, de cima, de baixo, do centro, defronte, de lado, do abraço afetuoso, do aperto de mão. O vírus está no ar.

Buscando na história alguma forma de atenuar o medo presente do desconhecido vale lembrar que os vírus, bactérias, bacilos, microorganismos letais, sempre existiram e grandes pandemias também. Este corona é uma novidade hoje, como outros já foram, como a peste negra medieval no século 14, a gripe espanhola no século passado, a gripe suína e a H1N1, que ficou famosa há uma década, provocando 2 mil mortes no Brasil.

Todas essas quizilas, contudo, ficaram no passado. Os microorganismos, letais ou não, são permanentes e temos que conviver com eles. Apesar das perdas humanas, fomos imunizados com vacinas ou nos tornamos imunes depois de passar pela doença. É um fato que a humanidade tem que acreditar. Não há como fugir. O possível é conviver com essas micros feras usando a melhor das nossas armas para a preservação da espécie: a ciência verdadeira.

Por isso, na chegada de 2021, além das vacinas contra a Covid, devemos ter esperança, assim entendida pelo filósofo e escritor Mário Sérgio Cortella: “Há pessoas que têm esperança do verbo “esperar”. O educador Paulo Freire falava da esperança do verbo “esperançar”. Esperar é: “Ah, espero que dê certo, espero que aconteça, espero que resolva”. Esperançar é ir atrás, é não desistir. Esperançar é ser capaz de buscar o que é viável para fazer o inédito. Esperançar significa não se conformar”. É isso e um bom 2021.

*Integrante da Cooperativa de Jornalistas de Pernambuco