“Se alguém me perguntar se eu faria tudo de novo, eu responderia que não”. Se no livro O que é isso companheiro? (1979) Fernando Gabeira fez uma espécie de mea-culpa da sua participação no sequestro ao embaixador norte-americano, sua recém-lançada autobiografia Onde está tudo aquilo agora? (Cia. das Letras) segue tom parecido, só que, dessa vez, sobre uma vida inteira. “Tenho pavor de repetir os mesmos erros. Está na hora de renová-los”, completa no livro de apenas 195 páginas, curtíssimo se levar em conta a quantidade de fatos reunidos pelo escritor.

Na nova obra, o autor deixa de ser, para os leigos no quesito Gabeira, apenas o homem da bandeira verde e um dos nomes por trás no sequestro ao embaixador Charles Elbrick, em 1969, turbulento protesto contra a ditadura militar, que lhe rendeu o best-seller. Para o leitor que espera capítulos suculentos sobre a luta a favor da legalização da maconha, por exemplo, ou outros causos que o tornaram manchete, o livro segue a direção oposta.

Sem se aprofundar muito em um ou outro assunto, Gabeira dá uma visão de uma movimentada trajetória nos bastidores de importantes acontecimentos verde-amarelos e mundiais.

Munido com história, Gabeira reflete, aos 71 anos, como suas certezas foram se desvencilhando. A esquerda, para ele, era como uma religião. A política é comparada ao futebol. Entre guerra de poderes, a escolha pelo melhor e a crença cega em ideias nunca, de fato, comprovadas, Gabeira retorna mais uma vez para onde começou. “Voltei ao jornalismo. Não é uma operação fácil”. O jornalista publica constantemente textos no seu site www.gabeira.com.br.

Mesmo para aqueles que já conhecem a trajetória de Gabeira a fundo, o livro serve pela reflexão. Poucas – e a maioria das vezes insensatas – pessoas conseguem passar uma vida toda com as mesmas e fortes convicções. A história de um político, ativista e jornalista que levantou bandeiras e decide questioná-las serve, no mínimo, pela discussão. Apesar disso, o autor não deixa esconder que a ecologia hoje ocupa um lugar antes preenchido por lutas antigas, mas hoje é tratada de uma forma diferente.

“Há muitas maneiras de contribuir com o País. Dos sonhos do século passado de acabar com a exploração do homem pelo homem restaram apenas as ruínas do chamado socialismo real. Quanto às grandes esperanças de democratizar o Brasil, a partir dos anos 1900, obtivemos grandes avanços materiais, e o país é hoje a sexta economia do mundo. Foi um processo de crescimento com a distribuição de renda. Mais uma razão de orgulho”. (Jornal do Commercio)

 

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