Uma consulta feita ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre a possibilidade de parlamentares migrarem para partidos em processo de fusão pode ser a última etapa para esvaziar por completo a regra da fidelidade partidária, como informa o Estadão.

Fixada pelo Judiciário em 2007, a fidelidade previa que o parlamentar que mudasse de partido sem justa causa perderia o mandato. Apesar de ter sido recebida como um avanço de costumes e fortalecimento dos partidos, os números mostram que a regra não pegou.

Na legislatura passada, após o Supremo Tribunal Federal confirmar – em outubro de 2007 – que os mandatos pertenciam aos partidos, 38 deputados trocaram de legenda. Na composição atual da Câmara, desde 2011, já foram 70 os deputados que mudaram de sigla. A maioria aproveitou-se da permissão para saída durante a criação de um partido, usada com sucesso pelo PSD, que amealhou 51 deputados federais. As brechas deixadas pela regra e o placar de cassações mantiveram o estímulo ao troca-troca partidário. Até hoje, apenas um deputado federal infiel foi cassado pela Justiça: o paraibano Walter Brito Neto, que trocou o DEM pelo PRB.

A consulta feita pelo deputado Sérgio Brito (PSD-BA) chegou ao TSE no início do mês e questiona se os parlamentares de determinado partido poderiam migrar para uma legenda formada pela fusão de outras duas siglas sem correrem o risco de serem cassados. No meio político, já foi anunciado que PPS e PMN se unirão para formar o MDMobilização Democrática. A dúvida sobre a possibilidade de cooptar parlamentares, porém, fez com que as legendas congelassem temporariamente a união. “Vamos esperar a resposta à consulta, porque tiveram prefeitos e parlamentares que ficaram inseguros”, disse o presidente do PPS, deputado federal Roberto Freire (SP).

Nova janela. Uma decisão do TSE dando sinal verde para a migração abriria nova janela no mercado de trocas partidárias. Especialmente porque a fusão de duas legendas é procedimento bem mais simples do que o complicado processo de criação de siglas, que exige a coleta de assinaturas em todo o País, com validação pela Justiça Eleitoral. Uma resposta positiva teria impacto nas eleições do ano que vem, uma vez que o MD sinaliza apoio ao governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), em sua eventual candidatura presidencial.

O líder do DEM, Ronaldo Caiado, ressalta que fechar as brechas deixadas pela decisão sobre fidelidade partidária é o objetivo do projeto de lei que inibe a criação de novos partidos. O andamento da proposta foi barrado no fim de abril por decisão do ministro Gilmar Mendes, que entendeu que a matéria era “inconstitucional” e “casuística”. O projeto – que impede que parlamentares que mudarem de legenda no meio do mandato transfiram para a nova agremiação parte do fundo partidário e do tempo no rádio e na TV da sigla de origem – tem o apoio do governo, porque no momento os principais partidos em gestação, MD e Rede, de Marina Silva, servem a interesses de candidatos da oposição.

Caiado, porém, observa que deixar as brechas abertas pode beneficiar o governo. Ele cita como exemplo seu próprio partido, que perdeu quase a metade dos parlamentares para o PSD. A legenda, idealizada pelo ex-prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab – seu presidente nacional -, já ocupa uma pasta no ministério da presidente Dilma Rousseff e sinaliza que vai apoiar sua reeleição.

 

Brechas. Essa nova brecha em análise no TSE se somaria a outras deixadas pelo Judiciário ao julgar a fidelidade partidária e que mantiveram vivo o troca-troca partidário. Conforme o julgamento de 2007, o partido poderia ir à Justiça pedir de volta o mandato do político infiel. Se não o fizesse, o Ministério Público poderia acionar o Judiciário. Entretanto, para que o mandato seja cassado, a legenda preterida pelo parlamentar precisa se dizer traída. Como parte das negociações políticas, isso não acontece.

Em alguns processos, o partido é questionado, mas faz vista grossa e diz não ter sido traído. Com isso, o parlamentar infiel mantém o mandato. Em outros casos, o partido nem cogita ir à Justiça pedir o mandato de volta. Foi o que ocorreu quando Marina Silva deixou o PT e se filiou ao PV para disputar as eleições de 2010.

A regra mais utilizada foi a da criação de partidos. Além do PSD, o PEN já serviu de abrigo a quatro deputados federais titulares e suplentes. Um dos ministros do Supremo diz, reservadamente, que a simples possibilidade de criação de novos partidos mostra que a regra da fidelidade nunca pegou. “A fidelidade nunca existiu”, avaliou.

 

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