Por João Bosco Leal
O tombo quando engatinhava provocou um pequeno corte no queixo da criança. Foi a primeira das muitas cicatrizes que seriam adquiridas ao longo de sua vida.
Depois de aprender a caminhar ela começou a correr, brincar de esconde-esconde, pega-pega, queimada, quando ocorreram novas quedas e surgiram novas marcas, algumas pequenas que logo sumiram e outras maiores, que permaneceram em seu corpo por muito tempo ou mesmo por toda a vida.
Além daquelas surgidas das mais diversas experiências ao longo da vida, as pessoas também adquirem outro tipo de cicatriz, bem mais profundas, não aparentes, provocadas pelas dores emocionais.
Logo nos primeiros anos de escola, quando inicia sua convivência social com outras crianças da mesma faixa etária, ela se decepciona quando têm sua primeira demonstração de interesse – realizada com os olhares ainda tímidos – ou a primeira paixão, não correspondida.
Na escalação da equipe de futebol, vôlei, basquete ou de natação, quando foi preterida por outra pessoa, ocorre uma nova frustração que também deixa marcas, mais ou menos profundas, dependendo da personalidade já adquirida por cada um.
Os resultados obtidos nas disputas, jogos, notas e provas escolares começam a provocar nos indivíduos, um senso de reconhecimento da própria capacidade que se refletirá em vários outros setores, como na carreira profissional e consequentemente no sucesso, pois todos são o resultado dos seus erros e acertos, das palavras que trocaram, do que viram, se lembram ou esqueceram.
Homens ou mulheres, os bem sucedidos serão admirados, enquanto aqueles que não se saíram bem serão praticamente ignorados pela sociedade que os circunda, o que gera maior autoestima nos primeiros, e baixa nos outros.
O fato de serem ou não admiradas por seus resultados nas mais diversas áreas, associado à sua maior ou menor autoestima provocará, nessas pessoas, reflexos inclusive nos relacionamentos com o sexo oposto, pois, inconscientemente e desde os primórdios, os humanos escolhem, para procriação, os vencedores.
Assim, independentemente da beleza física, aqueles que não obtiverem bons resultados, não se sobressaírem, certamente terão outras cicatrizes – agora sentimentais -, por serem preteridos pelos vencedores, muitas vezes sem os predicados físicos que possuem, mas certamente mais competentes em outras áreas.
As marcas físicas, causadas por acidentes do passado, são de feridas curadas, de superações, mas as dores das frustrações, das decepções, sejam com amigos, parentes, paixões ou amores, provocam cicatrizes aparentemente invisíveis, mas geralmente maiores que aquelas provenientes de impactos físicos.
São essas cicatrizes não aparentes e algumas vezes incuráveis – provocadas pelas dores sentimentais, da alma -, que transformam as pessoas, deixando-as tristes, amarguradas, enclausuradas, sem desejos ou novas perspectivas. Para elas não há remédio, a ferida pode até ser curada, mas a estória já ocorreu e a cicatriz existirá. Só lhes restará envelhecer com ela.
As cicatrizes adquiridas são as marcas do que vivemos, mas as invisíveis foram, certamente, as que mais doeram.
Nossas cicatrizes | João Bosco Leal
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