Incomodada com as manifestações de junho e no momento em que cresce internamente o diagnóstico de que é preciso renovar o partido, a cúpula do PT antecipou de fevereiro para dezembro a realização de seu 5º Congresso para atualizar o programa partidário. Depois de dez anos no comando do governo federal, o partido reconhece que, entre outros problemas, perdeu “densidade programática” e a capacidade de debate interno e com a sociedade.
Por isso, o Congresso será pautado por discussões sobre o diálogo com a nova classe C; a relação com os movimentos sociais; a crise de representatividade por que passam os partidos; a reforma tributária para que as classes mais altas paguem mais impostos; e problemas como mobilidade urbana e concentração de equipamentos culturais nas grandes cidades.
Antes mesmo das manifestações de junho, que pegaram a classe política de surpresa e suscitaram no PT o debate sobre o distanciamento entre o partido e as ruas, os petistas já estavam no divã. A convocatória do 5º Congresso, aprovada pelo Diretório Nacional no dia 8 de dezembro do ano passado, já dizia: “O PT perdeu densidade programática e capacidade de mobilização sobre setores que nos acompanharam nos primeiros anos de nossa existência. O debate interno está rarefeito. Sofremos um processo de burocratização e assistimos a um debilitamento de nossas instâncias coletivas de direção”.
No primeiro semestre deste ano, o PT realizou uma série de seminários temáticos durante as comemorações de seus dez anos na Presidência da República. Na ocasião, o partido traçou uma narrativa de sua gestão e fez uma comparação com o governo Fernando Henrique Cardoso. A ideia agora é refletir sobre o presente e traçar propostas para o futuro.
Presidente da Fundação Perseu Abramo, que pertence ao PT, Marcio Pochmann disse que uma das discussões será sobre o Estado laico e a mudança de estrutura da sociedade brasileira:
— As instituições religiosas certamente foram as poucas que ampliaram sua penetração na sociedade. Os sindicatos não conseguiram nem os partidos políticos, por exemplo. Houve uma mudança de estrutura na sociedade brasileira, de representatividade.
Uma das principais preocupações do PT, às vésperas das eleições presidenciais, é não perder a capacidade de diálogo com a nova classe C, que ascendeu durante os governos Lula e Dilma. “Diferentemente de uma visão economicista vulgar, a consciência de classe se constrói. Não entender isso pode significar que os principais beneficiários das transformações ocorridas no país não sejam capazes de reconhecer-se e identificar-se com as forças políticas que produziram essas mudanças”, diz o documento sobre o Congresso.
A antecipação deste fórum de discussão partidária, no entanto, não é consenso no partido. Integrantes da corrente majoritária do PT, a Construindo Um Novo Brasil, consideram um erro realizar o encontro em dezembro. Segundo eles, as discussões vão soar como um esboço de proposta de governo para um eventual segundo mandato da presidente Dilma, e podem gerar ruídos na pré-campanha.
— A pauta do partido é sempre mais ousada do que a do governo, e a presidente Dilma vai acabar tendo que desautorizar o partido — avalia um integrante da cúpula petista, que prefere não comprar esta briga.
Um exemplo desta diferença é a reinstauração do socialismo, pregada na convocatória do congresso. Esta é, naturalmente, uma pauta que não fará parte da proposta de governo para um segundo mandato de Dilma.
Depois do Congresso de dezembro, o PT fará novo encontro nacional em março, para discutir as alianças partidárias e o programa de governo para a campanha de reeleição.
Em entrevista ao jornal espanhol “El País”, divulgada no último fim de semana, o ex-presidente Lula pregou a renovação do PT e afirmou que, com o crescimento do partido e sua chegada ao poder, foram surgindo “defeitos”, como a valorização demasiada de cargos públicos e o surgimento da corrupção.
— O Partido dos Trabalhadores completou 33 anos de vida. Quando se chega a isso, os que começamos com 35 anos devemos dar espaço a uma nova geração — disse Lula, na entrevista.
A declaração ecoou no partido.
— Lula fez críticas duras. Para continuar mudando o Brasil, temos que mudar nosso partido, retomar valores que nortearam nossa criação. Não é possível voltar ao passado, mas é preciso revisitá-lo — disse o secretário-geral do PT, deputado Paulo Teixeira.
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