Por João Bosco Leal
Sem a interferência de imagens e sons, a mente humana pode nos proporcionar experiências inenarráveis. A ausência desses elementos facilita a concentração e permite que não nos desviemos do foco.
Sentado, só e em silêncio, fecho os olhos e inicio uma viagem inigualável, que ultimamente tenho realizado com bastante frequência. Imagino só o que me agrada, que gostaria que ocorresse e me lembro de detalhes de situações já vividas.
Assim, posso sonhar, imaginar coisas ou pessoas, viajar, enriquecer, rejuvenescer, enfim, tudo, mas o que mais me agrada é pensar em minhas paixões, algumas mais e outras menos duradouras, mas paixões.
E quando pessoalmente reencontro alguma, apesar das atuais rugas e cicatrizes que a vida nos impôs, percebo que não envelheceu, pois em minha memória está gravada exatamente como eu a conheci e com ela convivi.
Vejo-a como era, e o inverso certamente também ocorre, pois é inconfundível o brilho no olhar das pessoas que se reencontram e que entre si nutrem boas lembranças. Por isso não entendo as que tentam esconder a idade, fingir que, cronologicamente, são mais novas do que realmente o são.
Os anos vividos sem dúvida deixaram marcas aparentes, mas certamente acrescentaram coisas que na juventude não possuíamos, como a capacidade de dar mais e cobrar menos, sorrir e abraçar mais, discutir menos e relevar mais.
As antigas paixões são a presença atual desse tempo, quando muitas coisas hoje sem importância alguma, impediam a continuidade daquele relacionamento que talvez pudesse ter se transformado em um verdadeiro amor.
Mas o melhor de todos os sonhos é imaginar que aquela paixão – a única que se transformou em amor -, retorna aos meus braços, jovem e linda como sempre foi, com seu inesquecível cabelo preso com uma trança.
E a sós nos encontramos, com nossas rugas sem importância, invisíveis para o outro, pois assim como as rosas, os amantes também envelhecem. Sem lágrimas, mágoas ou lembranças ruins, nos abraçamos e beijamos como se nunca tivéssemos nos afastado e reiniciamos nosso caminho.
Mesmo que só na imaginação, a felicidade do reencontro de quem ama é infinitamente maior que a do encontro, quando ainda não amava.
Nele as histórias comuns serão relembradas e outras contadas, impedindo assim que o outro tenha qualquer desconhecimento ou dúvidas sobre os passos dados por seu amor enquanto ausente.
As lágrimas e os sorrisos, as chuvas e secas, a fome ou a fartura por que passaram, serão partilhadas detalhadamente, dando fim às preocupações mútuas e proporcionando a retomada da tranquilidade.
Então, tranque a porta, feche a janela, apague a luz, feche os olhos e sonhe. Você nem perceberá as horas passarem, pois estará junto de quem sempre quis estar.
Jogue suas primaveras ao vento e o abrace, sinta-o ao seu lado, de onde nunca saiu ou sairá.
Sonhando | João Bosco Leal
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