Por Carlos Newton

A liturgia do poder funciona no Brasil com tamanha intensidade que todo governante tem tendência a se distanciar perigosamente do convívio com o povo.  Se não fizer como o presidente uruguaio Pepe Mujica, que desprezou o palácio presidencial, os carros oficiais e até mesmo a maior parte de seu salário, o risco é de sofrer um isolamento altamente negativo, que abre um abismo entre o governante e o povo que ele deveria representar e do qual somente se reaproxima em época de eleição, quando toma cafezinho no bar, come buchada de bode, pega criança no colo, abraça e até beija qualquer pessoa que se aproxima, num teatro patético e sempre mal ensaiado, com cenas marcadas pelo artificialismo.

Esse fenômeno social acontece com praticamente todos os presidentes brasileiros, é uma característica de nossa prática política, mas isso está errado e tem de acabar. De todos os governantes, Juscelino Kubitschek e Itamar Franco, dois mineiros, tentaram furar esse bloqueio, pois até mesmo João Goulart e Jânio Quadros se isolaram no poder e acabaram pagando caro por isso.

JUSCELINO E ITAMAR

Mineiramente, JK vivia entre os candangos que construíam Brasília e Itamar gostava de andar pelas ruas em Juiz de Fora, sem companhia de seguranças, tinha saudades do fusquinha e até fez questão de vir assistir a um desfile das escolas de samba no Rio. Foram presidentes de verdade, que deixaram saudade.

Eu pensava que Itamar tivesse se formado em Medicina, como JK, porque certa vez assisti a uma cena interessante num voo entre Brasília e Rio. Uma mulher estava viajando com o filho de uns 10 anos, que começou a ter uma hemorragia nasal quando avião ganhou altitude. O senador mineiro deu atendimento à criança, mandou que a aeromoça trouxesse uma toalha com gelo, colocou o menino com o nariz para cima e ficou cuidando dele até passar a hemorragia. Somente muito tempo depois vim a saber que Itamar se formara em Engenharia Eletromecânica, lá mesmo em Juiz de Fora. Não era médico, apenas um homem de bem, prestativo e disposto a ajudar os outros.

Outros presidentes, como Sarney, Collor e FHC, caíram na armadilha do isolamento do poder. O próprio Lula, que tinha tudo para se tornar o maior líder político do país, também se afastou do povo e acabou virando uma patética antítese de Pepe Mujica, sofrendo uma metamorfose artificial, passando a se comportar como um ridículo novo rico.

IMPEACHMENT DE DILMA

Dilma Vana Rousseff, a guerrilheira, fez pior do que Lula, porque se isolou no poder sem ter feito carreira política, sem ter carisma e sem ter preparo. Comporta-se como se fosse uma líder da massas, capaz de arrebatar multidões, mas sua aventura política tem um encontro marcado com o fracasso. Seu partido naufragou num mar de lama jamais visto antes na História do Brasil, o impeachment é apenas questão de tempo, se é que ainda há um mínimo de decência e ética neste país.

A grande dúvida é saber o substituto. Se o PMDB foi envolvido diretamente no escândalo, pode atingir o vice-presidente Michel Temer, que não somente era presidente do partido, mas também foi beneficiado pelo caixa 2 da campanha de Dilma. Nesta hipótese, a presidência seria assumida pelo presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha, que também é do PMDB e terá de convocar eleições em 90 dias, caso Dilma e Temer sejam cassados nos dois primeiros anos de mandato, com nos ensina o comentarista Carlos Frederico Alverga, de olho na Constituição. Se o impeachment ocorrer no período final do mandato, a eleição será em 30 dias.

Daqui para lá, ninguém pode imaginar o que vai acontecer, mas há até a hipótese de o próprio Eduardo Cunha sair candidato à eleição pelo PMDB, com base na imensa visibilidade que terá, pois cabe a ele aceitar o pedido de impeachment e conduzir o processo até que haja a votação em plenário, com aceitação por dois terços dos deputados (342 votos). E la nave va, sempre fellinianamente.

 

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