Por Pedro do Coutto
Este título está inspirado num dos filmes famosos que consagraram Alfred Hitchcock no cinema e na arte mundial. Aproveito a inspiração para sugerir a todos que leiam a Constituição Federal e principalmente o art. 86, para descomplicar as controvérsias que têm surgido em torno do processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff. Tais controvérsias não são poucas e conduzem até analistas e cientistas políticos a erros de colocação. Lendo-se o artigo 86, as soluções, quanto aos caminhos a seguir, ficam nítidas e claras.
Em primeiro lugar, o pedido de impeachment formulado por Hélio Bicudo , Miguel Reale Junior e Janaina Pascoal, acolhido pelo presidente da Câmara Eduardo Cunha terá que ser examinado por uma comissão especial de 65 deputados escolhidos à base do critério de proporcionalidade partidária. Se a Comissão mantiver a procedência, o processo caminha. Caso contrário será arquivado. Vamos passar agora ao texto do art. 86.
Admitida a acusação contra a presidente da República, por 2/3 da Câmara dos Deputados, será ela – prestem atenção – submetida a julgamento perante o Supremo Tribunal Federal por infrações penais comuns, ou perante o Senado Federal nos crimes de responsabilidade. O conteúdo do pedido de impeachment no caso, refere-se à ocorrência de crime de responsabilidade. Portanto o julgamento será perante o Senado Federal.
ACUSAÇÃO PELA CÂMARA
Mas isso depois que a acusação tiver sido admitida pela maioria de 2/3 da Casa, ou seja por 342 deputados, quórum indispensável para a sequência do processo. Somente nesta hipótese a presidente ficará suspensa de suas funções por 180 dias. Verifica-se assim que seu julgamento pelo Senado somente ocorrerá se a Câmara reunir 342 votos para a continuidade do processo. Se no prazo de seis meses não ocorrer julgamento, a Presidente retornará a suas funções.
Clarificado este aspecto, passamos a uma segunda etapa. Ao definir o julgamento final pelo Senado, a Constituição deixa claro que o Senado poderá mudar a decisão da Câmara, pois se assim não fosse não haveria necessidade de o texto constitucional prever um segundo julgamento pela Câmara Alta. Se o Senado tivesse apenas um comportamento confirmativo, a Constituição, e lógico, não afirmaria a necessidade de o presidente da República ser julgado pelo Senado Federal. Seria uma contradição espantosa se o Senado não pudesse alterar o que a Câmara porventura decidir. E a condenação pelo Senado exigirá também 2/3 dos votos, no caso, 54 senadores.
VOTAÇÃO SECRETA
Essa tramitação, repito, fica condicionada à manifestação inicial de 342 deputados. E não possui relação direta com o fato de ter sido secreta a votação para escolha das indicações partidárias à Comissão Especial de 65 deputados. Tampouco está vinculada à formação da chapa alternativa que teve mais votos no Plenário da Casa. Estes dois pontos foram objeto de ação específica do PCdoB que culminou com a liminar do ministro Edson Fachin.
Se a liminar for mantida pelo plenário do STF, claro está que terá de haver nova eleição aberta para as indicações de cada legenda para compor a comissão especial. O mesmo fato abrange a apresentação da chapa alternativa. Levantou-se a perspectiva de algum ministro pedir vista do processo na sessão de quarta-feira. A perspectiva é improvável, como revelou o ministro Gilmar Mendes. Mas viesse a ocorrer, o que aconteceria? A ação não seria paralisada, continuaria prevalecer a liminar em vigor.
FATOS, SEM FACTÓIDES
Ao fazer a análise política, não se deve confundir o que está acontecendo com o que muitos desejariam que acontecesse. Não adianta brigar com os fatos, tão pouco com as hipóteses. O art. 86 ilumina os caminhos existentes. Só não ilumina a disposição demonstrada pelo vice Michel Temer de coordenar os votos do PMDB para que o impeachment, de acordo com a reportagem de Simone Iglésia e Júnia Gama, O Globo edição de domingo seja aprovado no final da ópera. Esta é uma outra questão e sobre ela escreverei um outro artigo. Aliás, o mesmo impulso do vice foi assinalado pelo repórter Adriano Ceolin, O Estado de São Paulo também de domingo. Vamos ver isso depois, caso Michel Temer confirme pelo silêncio as duas versões publicadas.
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