Por Carlos Newton

Não há contemplação. O presidente Michel Temer foi professor de Direito Constitucional, tem obras publicadas, aposentou-se como procurador do Estado de São Paulo, carrega uma biografia jurídica e não pode desconhecer a força da lei. Se insistir em manter Geddel Vieira Lima no Ministério, sem a menor dúvida estará cometendo crimes de responsabilidade e ficará sujeito a sofrer impeachment, poucos meses depois do afastamento e da condenação da presidente Dilma Rousseff, com base na mesma Lei 1.079, de 1950, que já tinha atingido Fernando Collor em 1992.

No processo da governante petista, os crimes de responsabilidade foram cometidos devido às pedaladas fiscais, com maquiagem das contas públicas e desrespeito à Constituição e à Lei de Responsabilidade Fiscal. No caso de Temer, trata-se de infrações ao Capítulo V, cujo artigo 9º discrimina os seguintes crimes de responsabilidade contra a probidade na administração:

(…) não tornar efetiva a responsabilidade dos seus subordinados, quando manifesta em delitos funcionais ou na prática de atos contrários à Constituição; (INCISO 3)

(…) proceder de modo incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo. (INCISO 7)

DUPLA INCRIMINAÇÃO – Como se vê, o presidente Michel Temer estará claramente incurso em dois crimes de responsabilidade expressamente previstos na chamada Lei do Impeachment, cujo ditames foram recentemente confirmados pelo Supremo Tribunal Federal, ao julgar ação movida pelo PCdoB às vésperas do afastamento de Dilma Rousseff.

O caso é gravíssimo, porque Geddel cometeu simultaneamente vários crimes e irregularidades. Não somente favorecimento pessoal, mas também improbidade administrativa, crime contra a administração pública, vantagem indevida através do uso do cargo e ameaça de demissão da presidente do Iphan (Patrimônio Histórico). Não satisfeito, Geddel intimidou o ministro e disse que já tinha acertado um parecer sob encomenda com a advogada-geral da União, Grace Mendonça, foi um verdadeiro festival. Tem de ser demitido a toque de caixa e a bem do serviço público.

COSTEANDO O ALAMBRADO – Como dizia Leonel Brizola, o fato concreto é que o presidente Temer já vem “costeando o alambrado” em termos de respeito à legalidade, ao manter no Ministério e no quadro de apoio político elementos investigados pela Lava Jato ou envolvidos em outros processos ou inquéritos, como os líderes do governo na Câmara (André Moura) e no Senado (Romero Jucá).

Na semana passada, o presidente escorregou feio, ao dar entrevista ao excelente programa “Roda Viva”, de Augusto Nunes, dizendo que Lula não deveria ser preso: “Eu espero que, se houver acusações contra o ex-presidente, que elas sejam processadas com naturalidade, mas a prisão de Lula eu acho que causa problemas para o país. Porque haverá movimentos sociais, e isso pode criar uma instabilidade”, afirmou, esquecido de que todos são iguais perante a lei.

CRIANDO INSTABILIDADE – Na verdade, quem mais está criando instabilidade no país é o próprio presidente da República, ao apoiar a chamada Operação Abafa, que visa a inviabilizar a Lava Jato, através de vários projetos de leis e emendas, exatamente como ocorreu na Itália em relação à famosa Operação Mãos Limpas, que ia passar o país a limpo, ficou pela metade e deu origem a um novo esquema de corrupção conduzido pelo primeiro-ministro Silvio Berlusconi.

Agora, diante desse episódio envolvendo Geddel Vieira Lima, ao invés de demiti-lo, a reação do Planalto foi espalhar notícias negativas contra o ministro da Cultura, Marcelo Calero, exatamente como havia acontecido com o então chefe da Advocacia-Geral da União, Medina Osório, submetido a intensa campanha difamatória. Ciente dessa estratégia do Planalto, Calero reagiu e prontamente denunciou Geddel, abortando a plantação de notícias que o Planalto já iniciara, como ficou claro na explosiva entrevista concedida a Natuza Nery e Paulo Gama, na Folha.

Temer tem de demitir Geddel na segunda-feira de manhã, assim que o encontrar no evento, para não se tornar convivente com os diversos crimes cometidos por seu ministro da Articulação Política. Se o fizer, até poderá se sair bem do episódio e estará definitivamente livre de Geddel. Mas fá-lo-á?  Logo saberemos.

 

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