Foi surpreendente, para quem está envolvido na Lava Jato, a decisão da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, que aceitou na terça-feira a denúncia contra o senador Valdir Raupp (PMDB-RO), um dos caciques do partido. Por unanimidade, os ministros concluíram que também a doação oficial, mesmo contabilizada pelo partido na forma na lei, pode ser considerada propina e crime eleitoral.
NÃO HÁ INOVAÇÃO – A bancada da corrupção, que é amplamente majoritária no Congresso, reagiu com veemência, como se tivesse surgido uma ilegítima novidade jurídica. Na verdade, essa possibilidade sempre existiu, não representa a menor inovação. Sempre que houver provas de que a doação oficial encobriu pagamento de propina, passa a ser obrigação do magistrado aceitar a denúncia e condenar o réu .
O fato é que, na esperança de justificar suas relações perigosas com empreiteiros e outros corruptores, muitos dos envolvidos da Lava Jato, incluindo o presidente Michel Temer, vêm baseando suas defesas na afirmação de que não negociaram nem aceitaram propinas, apenas receberam doações oficiais, permitidas na lei e obrigatoriamente registradas nas prestações de contas das campanhas eleitorais.
O que a Segunda Turma do STF fez, em sua decisão, foi alertar que a doação oficial não pode servir de “habeas corpus preventivo” para inocentar antecipadamente políticos, empresários e administradores públicos envolvidos em tenebrosas transações, como diria o genial compositor Chico Buarque, que infelizmente mancha sua biografia ao insistir em absolver os políticos do PT, agindo como se filiação partidária pudesse ser garantia de caráter ilibado e bons antecedentes.
FALTAM AS PROVAS – Agora os inquéritos vão abranger também as doações legais, caso a caso, e os delatores, que não podem mentir e precisam colaborar ao máximo, terão de apresentar documentos e registros contábeis. É exatamente o que o ministro-relator Herman Benjamin acaba de exigir dos principais delatores da Odebrecht, para comprovar declarações que fizeram em seus depoimentos no processo para cassar a chapa Dilma/Temer na Justiça Eleitoral.
Mas nem tudo está perdido para os corruptos. É improvável que a Polícia Federal e a Procuradoria-Geral da República consigam fazer a conexão e obter provas materiais de que muitas doações oficiais não passaram de propinas encobertas e significam lavagem de dinheiro.
DELAÇÃO AMACIADA – No caso de Michel Temer, por exemplo, o megaempresário Marcelo Odebrecht amaciou a situação do presidente, ao dizer que não negociou com ele os valores da doação ao PMDB. Mas o executivo Cláudio Melo Filho fincou pé e repetiu que no jantar no Palácio Jaburu tudo realmente foi acertado diretamente com Temer e o então deputado Eliseu Padilha.
Justamente por isso, o ministro Herman Benjamin marcou para esta sexta-feira (dia 10) uma acareação entre Marcelo Odebrecht, Cláudio Melo Filho e Hilberto Silva Mascarenhas, ex-funcionário do Setor de Operações Estruturadas, responsável pelos pagamentos ilícitos da empresa, que envolveram a fabulosa soma de US$ 3, 4 bilhões em oito anos, um verdadeiro recorde mundial. Nesta quarta-feira o ministro se animou e chamou mais um para a acareação: Benedicto Júnior, ex-presidente da Odebrecht Infraestrutura, o executivo que fazia os acertos pessoalmente com parlamentares e governantes.
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