Por Jorge Béja
Engana-se quem pensa e diz que o recurso de apelação de Lula, contra a sentença condenatória do juiz Sérgio Moro, vai demorar a ser julgado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), com sede em Porto Alegre. Fala-se numa demora de 12 a 15 meses. Ou até mais. Nesta quinta-feira, um comentarista de televisão chegou a dizer “esse julgamento vai acontecer depois das eleições de 2018”! É compreensível a projeção do comentário. A Justiça brasileira – nem tanto a primeira instância – é lenta demais. E culpada também é a legislação, que possibilita recurso contra tudo e para tudo, além dos fóruns e tribunais, que andam entupidos de processos por este país afora. A criação dos Juizados Especiais, penais e cíveis, estaduais e federais, muito pouco contribuiu para desafogar o Judiciário. Soma-se a isso o horário de funcionamento (atendimento) da Justiça: das 11 às 17 horas! Por que não das 8 às 18 horas?
Mas o certo é que juízes e serventuários fazem o que podem para que a Justiça seja menos lenta. Disso sou testemunha. Nasci, literalmente, no fórum. O parto foi nos degraus da escada de entrada do velho prédio (hoje museu) nº 29 de Rua Dom Manoel (centro do Rio) quando a outrora cidade maravilhosa era a capital federal. E no fórum nasci, cresci e advogo por 45 anos ininterruptos.
RECURSO DE LULA – Mas voltemos ao julgamento do recurso do ex-presidente Lula. Uma vez interposto e cumpridas as formalidades legais na 13a. Vara Federal de Curitiba, o recurso será, em seguida, enviado ao TRF de Porto Alegre. O fato é que, pelo menos até hoje, nenhum veículo da mídia publicou esta notícia que serve de título a este artigo e que nossos leitores passam a ser os primeiros a saber. Explica-se: Lula é pessoa idosa. Soma 71 de idade. E o Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/2003) e que regula os direitos assegurados às pessoas com idade igual ou superior a 60 anos (artigo 1º), garante e obriga, no título que trata “Do Acesso à Justiça”, a dar prioridade na tramitação dos processos e procedimentos e na execução dos atos (julgamento) e diligências judiciais em que figure como parte ou interveniente pessoa com idade igual ou superior a 60 anos, em qualquer instância (artigo 71).
RÉU IDOSO – Portanto, o recurso do ex-presidente quando chegar ao TRF-4 vai receber o carimbo de “Réu Idoso“, a ser posto na capa do processo, ou nas anotações eletrônicas, sem que haja necessidade de pedido formal de Lula postulando a prerrogativa da prioridade na sua tramitação. É o quanto basta para que o recurso de Lula receba tratamento prioritário para ser julgado com a brevidade que a lei determina. E nem se diga que tal prerrogativa depende de requerimento de Lula. Porque aquela disposição do parágrafo 1º do artigo 71, do Estatuto do Idoso ( “o interessado na obtenção da prioridade requererá o benefício a autoridade judiciária” ) somente é válida e aplicável para os feitos (processos) cíveis. Não, para os penais. Isto porque as previsões das leis processuais penais são diferentes das leis processuais civis. Nestas, os direitos são disponíveis. As partes podem até desistir da ação que contendem uma contra a outra. Já naquelas, os direitos são indisponíveis e cogentes, isto é, imperiosos e que não podem ser desobedecidos ou contornados.
DOIS EXEMPLOS – Apenas dois exemplos: se um réu disser ao juiz criminal que não quer ou não precisa ser defendido, sua vontade (ou decisão) é nula. Cumpre ao juiz, mesmo assim, a nomeação de defensor, público ou dativo. Se O réu, espontaneamente, também frente a frente com o juiz, confessa o crime, e se a confissão não vier acompanhada da(s) prova(s), a confissão é ineficaz. Não serve para a condenação. Eis apenas dois exemplos de direitos indisponíveis. O mesmo acontece com réu idoso. A prioridade na tramitação de seu processo é também direito indisponível. Lula não precisa pedir prioridade. Seus 71 anos já são a prioridade, independentemente da sua vontade ou decisão.
CABE AO MPF – E é dever do Ministério Público, seja como autor da ação penal, seja como fiscal da lei, requerer a concessão da prioridade para o réu idoso, caso esta condição passe despercebida pelo serviço cartorário ou pelo juiz – no caso de Lula, pelos servidores da Turma Especializada e/ou pelo relator do recurso do TRF de Porto Alegre. As normas legais cogentes, tal como essa da prioridade de tramitação na justiça dos processos criminais em que figure como parte réu com idade igual ou superior a 60 anos, são comandos legais de ordem pública, que se impõem de modo absoluto e que não podem ser desrespeitados por vontade ou omissão da parte. Daí se concluir que, se a lei for cumprida – e toda lei é para ser cumprida, mormente por parte da magistratura –, o recurso de Lula pode ser julgado antes do Natal de 2017.
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