Por Fernanda Perrin e Flavia Lima / Folha
Cerca de 1,4 milhão de trabalhadores deixaram de contribuir com a Previdência Social desde 2014, ano de início da recessão, de acordo com dados do IBGE divulgados nesta terça-feira (31). O movimento se intensificou em 2017. O percentual da força de trabalho que contribui para a aposentadoria – que vinha resistindo à crise no mercado de trabalho – caiu para 63,8% no trimestre encerrado em setembro, o mesmo nível observado no início de 2014.
A situação contrasta com o ano passado, quando 65,5% da força de trabalho ocupada continuou contribuindo para a aposentadoria, apesar da alta do desemprego. Essa queda, porém, não se refletiu na receita da contribuição da Previdência, que apresenta ao longo deste ano pequena recuperação. Até agosto, a alta é de 4,6% sobre igual período de 2016. A expansão ocorre após essa receita ter despencado 10,8% (entre 2014 e 2015).
PARADOXO – Uma explicação para o paradoxo é a recuperação assimétrica do mercado de trabalho, diz o economista Luis Eduardo Afonso, professor da Universidade de São Paulo. Embora a taxa de desemprego tenha recuado de 13%, no trimestre encerrado em junho, para 12,4%, no encerrado em setembro, a melhora é sentida no mercado informal. Os informais continuaram a contribuir em 2016. De lá para cá, porém, a expectativa com relação à melhora da situação econômica pode ter piorado a ponto de esses trabalhadores terem deixado de contribuir, diz Bruno Ottoni, do Ibre, da FGV. Outra possibilidade é que a nova leva que entrou no mercado nos últimos meses não consegue contribuir, diz.
TENDÊNCIA NEGATIVA – De modo geral, a tendência é que a maior parte desse grupo, formado em especial pelos trabalhadores por conta própria, não contribua com a Previdência, diz Sarah Bretones, da MCM Consultores.
Já o número de trabalhadores com carteira assinada, cuja contribuição é descontada em folha, continua declinante. Assim, a queda de contribuintes seria resultado do declínio de celetistas e da decisão dos informais de não dar dinheiro à Previdência. Isso não se refletiria na arrecadação porque a massa de salários tem apresentado crescimento, mesmo descontada a inflação. Como a contribuição previdenciária incide sobre o salário nominal, o volume arrecadado consegue se manter, ainda que caia o número de contribuintes. A alta da ocupação entre empregadores, que possuem a maior remuneração média entre os trabalhadores, também justificaria o quadro.
PEJOTIZAÇÃO – A queda recente da proporção de contribuintes acende um sinal de alerta para a Previdência, cujo rombo sobe ano a ano. A discussão de reforma está paralisada no Congresso, e com a proximidade das eleições, analistas apostam na aprovação de uma versão diluída do projeto. Enquanto isso, a ampliação das possibilidades de terceirização está valendo desde o início do ano. Isso abriria caminho para trabalhadores serem contratados como pessoas jurídicas, diz Ottoni.
O PJ paga cerca de um terço de tributos em comparação a um empregado registrado, mesmo exercendo tarefas muito parecidas. O fenômeno da pejotização, no entanto, não é novo e vem aumentando nos últimos anos. “O PJ é mais expressivo nas classes com renda maior. A existência dele é uma distorção, resultado do sistema tributário. Por isso, as três reformas – previdenciária, trabalhista e tributária – estão ligadas”, afirma Afonso.
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