Por  Carolina Brígido

 

Era terça-feira, véspera do julgamento do recurso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), em Porto Alegre. O país em transe, grudado na TV e celulares, políticos e advogados fazendo suas apostas sobre o placar que acabaria por selar o destino do petista. Mas Joaquim Barbosa não quis nem saber. Aposentado do Supremo Tribunal Federal (STF) desde 2014, ele manteve o hábito de ler apenas o noticiário internacional — em especial o jornal francês “Le Monde” e o americano “The New York Times”.

O aparente desinteresse — até mesmo pelo processo que culminaria com a condenação de um ex-presidente — escancarava a relação tensa e ambígua de Barbosa com a política: ora tem desejo de ser protagonista do processo eleitoral, ora repudia a ideia. O que não se altera é o cerco que sofre de partidos políticos que o desejam concorrendo à Presidência. E agora, com Lula em fase minguante, mais do que nunca toda gincana de nomes para o Palácio do Planalto o envolve.

Nos últimos dois anos, Barbosa foi procurado pela Rede, de Marina Silva. Relator do mensalão, ação penal que levou à cadeia líderes partidários e feriu o PT, ele virou símbolo de combate à corrupção. Recusou a investida. Hoje, flerta com o PSB. No ano passado, Marina o procurou por intermédio de um amigo em comum: o também ex-ministro do STF Carlos Ayres Britto. Foram muitas conversas, muitas ideias semelhantes. Quando percebeu que seu lugar seria de coadjuvante na chapa, Barbosa fechou as portas.

Agora, a Rede está em negociação avançada com Ayres Britto. A ideia era torná-lo vice na chapa que concorrerá ao Palácio do Planalto. Apesar de não simpatizar muito com o posto, diz que quer ajudar Marina a se eleger. Mas acompanha a movimentação de Barbosa.

— Para participar do processo eleitoral, é preciso vontade, pulsão. Eu não tenho essa motivação. Mas, pelo que eu sinto, o Joaquim Barbosa tem essa vontade, essa pulsão. Eu acho ele muito bom, extremamente competente e bem preparado.

Atualmente, Barbosa conversa com uma ala do PSB interessada em vê-lo presidente do país. Cortejado, não disse nem que sim nem que não. Vai deixar a decisão final para março, o fim do prazo para a filiação de candidatos.

Barbosa se diz preocupado com o futuro do país, que vê assolado pela corrupção. E não esconde a satisfação de ser lembrado como alternativa em um cenário político em busca de um nome novo.

Os amigos dizem para ele ficar longe da política. Imaginam que Barbosa não se encaixaria ao figurino brasiliense de brigas sob holofotes, mas que acabam em afagos e conchavos nos bastidores. O ex-ministro diz o que pensa sem cerimônias e mantém a convicção. Muitas vezes, esse estilo causou desavenças e inimizades no STF.

No PSB, o principal entrave a Barbosa é o vice-governador de São Paulo, Márcio França. Ele deve ocupar a cadeira do titular, Geraldo Alckmin, para o tucano se candidatar. França já prometeu apoio a Alckmin na corrida presidencial. Com isso, não teria espaço para Barbosa no PSB. Por questões ideológicas, o ex-ministro não teria nenhum interesse em integrar uma chapa com Alckmin se o PSB se bandear para o lado do tucano. Até essas questões internas do PSB se assentarem, Barbosa joga parado.

Em passagem recente por Brasília para atender a um dos clientes de seu escritório de advocacia, aproveitou o intervalo entre um compromisso e outro para bebericar um suco de abacaxi com hortelã em tarde ensolarada. Os frequentadores do restaurante e garçons pararam para cumprimentá-lo. Fora da ribalta do STF, ainda é uma pessoa pública. Isso o anima.

Barbosa vive na ponte aérea entre Rio de Janeiro, São Paulo e Brasília, com algumas idas ao exterior. Ele mora no Rio, em um apartamento no Leblon, perto da praia, comprado em 1998, quando ainda era integrante do Ministério Público. No Rio, faz exercícios físicos e gosta de caminhar pelo calçadão da praia. Às vezes, faz uma pausa no percurso para tomar um chope com os amigos. Não dirige. O meio de transporte é o metrô, que tem uma estação ao lado de sua casa. Recentemente assistiu ao filme “Roda Gigante”, do diretor americano Woody Allen. Não gostou. Leu “A noite da espera”, do brasileiro Milton Hatoum, e lembrou-se da própria adolescência vivida em Brasília, durante a ditadura militar. Desse ele gostou.

PARECER A R$ 250 MIL

Os escritórios de Barbosa atendem a grandes empresas e entidades de classe. Ele não atua exatamente como advogado de causas, mas como parecerista — ou seja, um especialista que redige um trabalho sobre um assunto que pode estar na Justiça. Cada parecer de Barbosa não sai por menos de R$ 250 mil. A cifra é até modesta em comparação com outros ex-ministros do STF, que cobram até R$ 500 mil por parecer. Soma-se aos ganhos da nova atividade profissional, a aposentadoria como ex-ministro da corte, de R$ 33,7 mil brutos.

Se o destino — e as articulações políticas que terá que fazer — não o levarem ao Planalto, Barbosa tem um plano em vista: se aventurar nas grandes causas, como advogado mesmo. Até fazendo sustentação oral no plenário do STF — e, de certa forma, voltando ao local que o deixou famoso, mas do outro lado do balcão.

 

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