Por Igor Gielow /Folha

Com o transe político compreendido entre o voto de Rosa Weber e a descida de Lula do helicóptero na PF de Curitiba se distanciando no tempo e ganhando o tamanho devido, a realidade bate à porta do PT. Se o Supremo Tribunal Federal não der oxigênio ao plano inicial petista de levar à campanha do inelegível Lula ao último recurso, mudando seu entendimento sobre prisões de segunda instância e castrando quimicamente a Lava Jato, o partido precisará fazer escolhas rapidamente.

Solidariedade com pares nunca foi o forte de Lula, como todos os candidatos a estrela do PT desde os anos 1980 sabem bem. O movimento de dar supostos poderes à ré Gleisi Hoffmann neste primeiro momento apenas evidencia isso: ele não quer ninguém politicamente apto tomando decisões.

HADDAD, PRESUMIDO – Pode ser uma forma também de proteger Fernando Haddad, príncipe herdeiro presumido que não dialoga com a “nomenklatura” petista, esta por sua vez num mato sem cachorro com as agruras jurídicas de Jaques Wagner.

A alegação de que a campanha estará na rua com Lula preso, neste cenário, parece só torcida. Logo, passada a celebração da missa negra fornecida pela ingenuidade esperta de Sérgio Moro ao deixar Lula zombar da lei, a família terá de falar sobre a herança.

No cenário atual, frentes únicas são apenas uma tara que remonta a esquerdistas das antigas. A história do campo no país é um longo conto de divisões e traições, e o que se apresenta agora é um estágio em que o PT está vulnerável a ser predado.

OS HERDEIROS – Ciro Gomes e o partido se desprezam. Guilherme Boulos precisa botar a cabeça para fora de seu elemento, acampamentos do MTST e o eixo Vila Madalena-Leblon. O resultado será nulo, mas é preciso começar por algum lugar. Manuela D´Ávila, nem isso. Isso, claro, muda se o STF ou qualquer outro evento jurídico soltarem mais rapidamente o ex-presidente: aí a implosão do PT como sigla majoritária da esquerda tende a ser algo contida quando a inelegibilidade de Lula for decretada. Haverá até lá mais turbulência política, o país sofrerá, mas o petista com sangue nos olhos não dará a mínima. No fim, o impasse será o mesmo.

NO SEGUNDO TURNO – Aqui cabe um parêntese: a propaganda do PT, amplamente reverberada, dá de barato que Lula estaria eleito se concorresse. Falso. Ele estaria no segundo turno, favorito sim para perder (menos, provavelmente, contra Jair Bolsonaro). Apenas pessoas emocionalmente envolvidas, intelectualmente desonestas ou ambas as coisas menosprezam a rejeição antipetista. Durante três décadas, Lula se consolidou como o ouroboros da esquerda brasileira, a serpente que se alimenta do próprio rabo num ciclo infinito. Só que a versão jararaca do bicho apresentou defeito, travando consigo todo um campo do espectro eleitoral.

 

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