Por Rodolfo Costa / Correio Braziliense
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), tirou o corpo fora da articulação política conjunta com o governo, em um movimento que pode provocar o “tsunami” previsto na sexta-feira pelo presidente Jair Bolsonaro. O Palácio do Planalto tem importantes matérias para aprovar — como a PEC da Previdência e a Medida Provisória 870, que trata da reforma administrativa —, que, agora, ficam com a interlocução ameaçada.
Na prática, caberá ao ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, fazer a “contagem de votos”, ou seja, convencer os congressistas a votarem com o governo, tarefa que vinha sendo dividida com Maia. Mas não será uma tarefa simples.
BASE ALIADA? – Boa parte das dificuldades diz respeito às interlocuções feitas pelo Planalto, que reluta em ceder espaços a apadrinhados políticos nos estados. O resultado disso foi a derrota do governo em relação ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), que, pelo relatório da MP 870 aprovado na Comissão Especial mista no Congresso, sai do Ministério da Justiça e vai para o Ministério da Economia.
A relação entre Maia e o governo se desgastou ainda mais depois que os filhos de Bolsonaro e apoiadores começaram a atacar o Centrão, sem o governo se mobilizar para apagar o incêndio. A pouca disposição de Lorenzoni — em nome do presidente da República — para mudar a interlocução com o Congresso tirou Maia do diálogo.
O movimento do presidente da Câmara é estratégico: evitar desgaste com eventuais acusações de toma lá da cá contra partidos como PP, PR, PRB, MDB, PSD, PTB e DEM.
NOVO MINISTRO – O chefe da Casa Civil grudou em Maia nas últimas duas semanas e aproveitou o momento para pedir votos, com a sinalização de indicar um nome político para o Ministério das Cidades que, pelo relatório aprovado da MP 870, será recriado, por meio do desmembramento do Ministério do Desenvolvimento Regional.
O governo sugeriu o nome do secretário dos Transportes de São Paulo, Alexandre Baldy (PP), ex-titular da pasta, e pediu empenho de Maia para convencê-lo. No entanto, o deputado disse não, conforme afirmaram interlocutores ontem, sobretudo por ter sido alertado por líderes do bloco político, em especial PP, PR e PRB, que só um ministério não atende o Centrão.
O “tsunami” mais provável deve vir com a probabilidade de a MP 870 caducar. Interlocutores de Maia dizem que ele não se desdobrará para evitar o contrário, deixando a tarefa a cargo da Casa Civil.
Com a viagem a Nova York, onde permanecerá por alguns dias, o presidente da Câmara deixará votações importantes para a próxima semana — uma mostra de como ele é importante para o governo.
TRANSTORNO – A perda de efeito da reforma administrativa seria uma dor de cabeça para o Executivo. Com a possível retomada da estrutura de 29 ministérios, e não 22, como são hoje, o governo precisaria buscar novos ministros, elevando a sobrecarga da articulação política. É aí que reside o problema.
A classe política quer ocupar pastas e ter orçamento para tocar medidas públicas e ganhar os louros com as consequentes ações nos estados. Mas isso não ocorrerá enquanto Bolsonaro não mudar o discurso.
“Ninguém quer estar com um presidente que não consegue controlar os próprios filhos”, explicou um líder.
CATALISADOR – A desconfiança com o governo é grande, e Maia atua como um catalisador dos anseios do Centrão. A demissão do ex-ministro-chefe da Secretaria-Geral Gustavo Bebianno e a eventual dispensa do ministro-chefe da Secretaria de Governo, Santos Cruz, são outros fatores que deixam as lideranças apreensivas.
Por tudo isso, Maia se afastou da articulação com o governo para deixar que o Planalto se organize sozinho, sem sofrer o desgaste. “O próprio Baldy não quer trocar o projeto certo em que está por um duvidoso”, disse um vice-líder. “Como ter confiança em gerir uma pasta sem ter certeza de que o presidente da República vai defendê-lo de eventuais acusações dos filhos e aliados?”, acrescentou. Restará a Bolsonaro resgatar a confiança com gestos, não palavras.
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