A votação final do edital de 5G realizada pelo conselho da Anatel nesta quinta, 25, tem um grande vencedor: o ministro das Comunicações, Fábio Faria. Ao final, prevaleceu a vontade do ministro que marcou vários pontos políticos: conseguiu dar uma solução para as pressões pela exclusão da Huawei do 5G, impôs um cronograma e ainda conseguiu dar ao presidente Bolsonaro um fato positivo a ser explorado em plena campanha eleitoral de 2022. E paralelamente ainda ajudou um pouco na crise diplomática com a China que por pouco não comprometeu ainda mais o já combalido cronograma de vacinação para a Covid-19 no Brasil.

A votação do conselho da Anatel manteve as linhas gerais do que já havia sido apresentado por Carlos Baigorri, relator da matéria, com um adendo importante: uma sugestão trazida pelo conselheiro Moisés Moreira para que se antecipasse o início do 5G nas capitais para julho de 2022, contra 31 de dezembro originalmente previstos. Com isso, se tudo correr bem, as primeiras operações de 5G entram no ar antes das eleições presidenciais e parlamentares do ano que vem e poderão ser capitalizadas nas campanhas, com a presença sempre requisitada do ministro ou até mesmo do presidente-candidato em inaugurações locais. Não é um fato novo: o 4G também começou em meados de 2013, a tempo da Copa das Confederações daquele ano, e a tempo das eleições. Dilma não fez muito uso do 4G na campanha eleitoral daquele ano porque as manifestações de junho de 2013 acabaram mudando a pauta política.

Há um risco, contudo: a liberação para o uso da faixa de 3,5 GHz está vinculada à limpeza da banda C estendida nas aplicações corporativas de banda C e à migração dos usuários de TVRO (TV aberta via satélite) para a banda Ku. Especialmente a migração para a banda Ku é um processo extremamente complexo e ainda muito nebuloso, porque não se sabe exatamente quantas pessoas receberão os kits, onde elas estão e qual será a dificuldade de instalação, fora a necessidade de se montar a logística. O prazo previsto no edital é de no mínimo 300 dias a partir da publicação do termo de autorização da faixa no Diário Oficial, o que significa que o edital precisa estar concluído, impreterivelmente, até julho.

Para isso, Anatel e TCU precisam concluir o cálculo de todos os valores mínimos e contrapartidas do edital em 60 dias. Se o TCU usar o prazo regimental, de 150 dias, o cronograma político do 5G começa a ficar comprometido. Não por acaso Fábio Faria levou três ministros do TCU em sua viagem para conhecer fornecedores de 5G e disse ter negociado um prazo de análise de 60 dias. Mas vale lembrar que Fábio Faria não levou na comitiva o ministro Raimundo Carreiro, que é justamente quem será o relator do processo no TCU, e que acompanhou as quase 6 horas de reunião da Anatel desta quinta. Nada garante de antemão que essa antecipação de prazos pelo tribunal de contas, seja pela área técnica, seja pelo relator, acontecerá.

Fábio Faria também poderá apresentar ao presidente Bolsonaro uma solução pacificadora para a questão dos fornecedores chineses. Afinal, a Portaria 1.924/2021 assegurou uma rede privativa para o governo interligar 16 mil pontos em todo o Brasil e onde ficará fácil para o governo excluir fornecedores A ou B. Ali, provavelmente, Huawei e outros fornecedores da China devem ser banidos com a justificativa de que, por não estarem listadas em bolsa, não seguem padrões de governança e transparência. Isso pode acalmar a ala ideológica do governo, o que inclui o próprio presidente.

Mas Fábio Faria ainda tem uma carta na manga caso a pressão para que Bolsonaro exclua os fornecedores chineses de todo o 5G brasileiro cresça: a exigência de uma rede standalone para o 5G, que prevaleceu na versão final do edital. Com esta exigência, as operadoras terão que instalar uma rede nova e desvinculada das redes atuais 4G. O que torna menos complexa a tarefa de excluir fornecedor A ou B caso o governo imponha isso futuramente. Por exemplo, depois que boa parte da população estiver vacinada e que a dependência de vacinas e insumos chineses não for mais uma variável política importante.

Em termos de políticas públicas setoriais, Fábio Faria também marcou um gol. Arrumou mais R$ 1,5 bilhão para um projeto que vem cambaleante há mais de seis anos. O PAIS (Programa Amazônia Integrada e Sustentável), que receberá aporte das empresas vencedoras do leilão de 5G, é o Amazônia Conectada, uma rede sub-fluvial na Amazônia lançada em julho de 2015 que fracassou sob a gestão do Exército. O cabo de fibra ótica rompeu-se após pouco mais de um ano de operação, e assim está desde então, sem que o Ministério da Defesa tenha conseguido mobilizar recursos ou logística para consertá-lo integralmente. Em 2019, o TCU mandou que o Ministério das Comunicações assumisse o projeto. Foi o que o ministro fez.

Telebras

Já a Telebras parece uma dor de cabeça para Fábio Faria, mas na verdade é um trunfo. Como a estatal está no programa de privatização do governo, tocada pelo Ministério da Economia, não pegaria bem dizer que ela está sendo fortalecida ou atribuir a ela qualquer política pública. Mas obviamente nem os militares do governo, nem o PSD, partido de Fábio Faria, se esforçam para que ela seja privatizada (de novo). Não por acaso, o projeto da rede privativa foi desenhado e calculado pela Telebras, e entrou na Portaria 1.924/2021 justificada justamente pelo artigo 12 do Decreto de Políticas de Telecomunicações (Decreto 9.612/2018), que lista as atribuições da estatal. Percebendo o desconforto da Economia com a “anabolizada” que estava sendo dada para a Telebras, Fábio Faria soltou uma nota dizendo que não será a estatal quem vai operar esta rede e que, se necessário, haverá mudança dos instrumentos normativos. Para tornar discurso em realidade, contudo, Faria precisaria alterar a Portaria e também o Decreto, o que não aconteceu ainda.

E a Telebras ainda se tornou um trunfo para uma política de varejo junto a parlamentares e prefeitos com o programa WiFi Brasil (que é uma adaptação do antigo GESAC), que cria uma comunicação direta entre o Ministério das Comunicações e centenas de municípios por meio de emendas parlamentares dedicados a esse programa. Gilberto Kassab (PSD) já havia desenhado esse modelo com o Internet para Todos, que não deu certo porque tinha uma fragilidade tributária.

Vale citar ainda que, com a aprovação do PL 3.477/2020, o governo está autorizado a liberar R$ 3,5 bilhões do Fust para municípios contratarem banda larga e comprarem equipamentos para escolas. Não será surpresa se a liberação vier junto com algum programa operador pela Telebras.

TeleTime

 

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