Por Adriana Fernandes*

Não foram a Caixa e o Banco do Brasil que desembarcaram da Febraban. É a Febraban que está rompendo com a política econômica do governo Jair Bolsonaro. A simbologia desse desembarque, após a entidade assinar um manifesto da Fiesp pedindo medidas urgentes para o Brasil voltar a crescer e gerar empregos, é notadamente política e grave para o governo. Mas é também econômica, ao expor a insatisfação diante da escalada de hostilidades entre as autoridades públicas e fazer a defesa de pontos básicos institucionais que garantem o bom funcionamento da economia. Trata-se de uma ação pública radical para os padrões da Febraban, que vê nesse ruído institucional atraso para a recuperação econômica.

O movimento já estava a caminho quando banqueiros assinaram, no início de agosto, um manifesto que conectou boa parte da elite da sociedade civil em defesa do sistema eleitoral brasileiro para dar um basta às ameaças do presidente à democracia, entre eles Pedro Moreira Salles e Roberto Setubal, do banco Itaú Unibanco, e o CEO do Credit Suisse Brasil, José Olympio Pereira.

Olympio chegou a dizer que a “fervura aumentou e o sapo está na panela. Temos de pular enquanto é tempo”, em entrevista ao O Globo, declaração que enfureceu a área econômica.

Do lado dos bancos públicos, a decisão de romper com a Febraban, às vésperas de manifestações marcadas pelo presidente no feriado da Independência de 7 de setembro, foi tomada porque o governo viu no manifesto da Fiesp um ato político contrário a Bolsonaro, que o é de fato, mas que deveria ter sido respondido de outra forma, se assim quisessem. A realidade é que se configura ingerência política em bancos públicos, que são empresas de Estado e não de governo.

Nunca é demais lembrar que, no início do governo, o ministro da Economia, Paulo Guedes, falava com orgulho que a escolha dele para os bancos tinha sido de “porteira fechada”, em outras palavras, uma administração altamente profissional e longe da interferência. Um mito que foi se desfazendo em vários episódios ao longo do governo Bolsonaro e que tem sua capitulação final na decisão de rompimento com a Febraban, ainda não confirmada oficialmente, mas que teve apoio de Guedes. O presidente da Caixa, Pedro Guimarães, é hoje um dos mais fiéis escudeiros de Bolsonaro e o comando do BB foi trocado não há muito tempo para atender uma ordem do presidente.

Para além do calor do momento, a saída subserviente da Caixa e do BB da Febraban terá consequências. Dirigentes da Caixa e do BB terão que dar explicações ao Tribunal de Contas da União. Reportagem do Estadão, por sinal, já mostra que os bancos estão preocupados.

É bom que eles se preocupem mesmo porque os bancos públicos não podem sofrer esse tipo de ingerência por razões políticas, principalmente o BB, que é uma sociedade de economia mista, com acionistas minoritários e ações negociadas em mercado fiscalizadas pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM). A Caixa, que não conta com capital aberto, tem sua gestão regulada pela Lei das Estatais.

Pouco tempo atrás, o ministro Bruno Dantas do TCU, acatando pedido do MP junto ao Tribunal, suspendeu todo o uso da verba publicitária do BB em sites, blogs, portais e redes sociais acusados de espalhar fake news por orientação da Comunicação do Palácio do Planalto e indiretamente do filho do presidente Carlos Bolsonaro.

Se a saída da Febraban foi aprovada pelo board dos dois bancos, todos os diretores podem ser responsabilizados na pessoa física pelo TCU com multa e até mesmo punição de ficarem inelegíveis para cargos públicos.

Seria uma condenação não para agora (provavelmente demoraria anos, com eles já fora dos bancos públicos), mas que certamente traria danos para as carreiras desses dirigentes no setor privado.

Afinal, que política de compliance (cumprimento das normas legais) de uma empresa ou banco do setor privado aprovaria um nome de alguém condenado pelo TCU?

*Colunista do jornal Estado de S. Paulo

 

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