Por Márcio de Freitas*

O Brasil elegeu diretamente cinco presidentes da República desde 1989. Dois deles foram impedidos de concluir seus mandatos: Fernando Collor e Dilma Rousseff. Contra essa mortalidade na casa de 40%, a vacina é ter uma base aliada fiel no Congresso. Não à toa, o presidente Jair Bolsonaro atrelou o Centrão, com orçamento secreto e tudo, ao seu mais íntimo ministério, com as pastas palacianas da Casa Civil (Ciro Nogueira) e Secretaria de Governo (Flávia Arruda) a abrir espaço para Progressistas e PL.

Líder nas pesquisas, Luiz Inácio Lula da Silva abre todos os braços para também ampliar suas possibilidades em caso de eventual vitória. Mira uma federação de partidos (já que as coligações na proporcional foram vetadas pela lei eleitoral) com capacidade de eleger perto de 180 deputados. É mais que o cabalístico 172, número de deputados federais que precisam votar contra para enterrar um possível pedido de impeachment na Câmara.

Lula ainda busca setores tradicionais do PSDB para aproximação, caciques do MDB e o PSD inteiro, num movimento ao centro político sem o Centrão. Em tempos de revoada tucana em plena migração eleitoral, o petista abre seu viveiro para antigos adversários — que hoje estão muito longe de voltar a ocupar o Palácio do Planalto por decisão direta de eleitores. Não chega ainda a ser uma consertasión, nem um Pacto do Moncloa, mas atrai os sociais-democratas pelo apelo social do momento e pela defesa da democracia, mais que necessária em momento histórico mundial de questionamento do modelo…

O “não chega ainda” é porque radicais do PT não o permitem nem se consegue conter os ataques contra o vice escolhido por Lula: o tucano depenado Geraldo Alckmin, que se desfiliou do PSDB no fim do ano passado. O próprio Lula não faz elaboração conceitual de suas articulações. É mais pragmático e prático do que intelectual. Além disso, como dito acima, a espada do impeachment flutuando sobre a cabeça dos eventuais presidentes da República, dá ao movimento um caráter bem defensivo.

Governar exige maioria, e sobreviver à política cobra uma fatura de apoios amplos em tempos de riscos elevados. Lula perdeu esse patrimônio acumulado em seu governo pela ação de Dilma Rousseff. Aliás, por duas vezes, ele foi impedido de disputar a Presidência da República. Em 2018, o autor da façanha foi o ex-juiz e agora político Sergio Moro. Em 2014, foi a própria Dilma que barrou o retorno de Lula ao Palácio do Planalto e fincou-se como candidata de si mesma. Deu no que deu.

Esse longo tempo fora do poder, obriga Lula a reunir forças, juntar tropas, montar uma linha de defesa e se organizar para eventual governo. Bolsonaro não precisa fazê-lo, pois tem o Centrão para chamar de seu se vier a ser reeleito.

Em todo caso, o movimento pode arregimentar tropa para um embate fundamental em 2023, o controle do Orçamento. Hoje, o presidente da Câmara, Arthur Lira, é o senhor das verbas secretas, que diminuíram o poder e influência do presidente Jair Bolsonaro. Se o modelo persistir, muitas das promessas do futuro governo podem ficar pelo caminho por falta de capacidade do governo de influenciar, e controlar, o Legislativo.

É por isso que Lula tenta fortalecer suas fileiras com a presença de alguns outros partidos, se municiando para essa batalha. O presidente do PSD, Gilberto Kassab, tem sido cortejado e resiste sem muito esforço, e nenhum pudor, ao namoro de Lula. Além disso, partes do MDB, do Republicanos e de outras legendas soltas no mercado político, podem ser fundamentais para garantir a governabilidade a um possível governo petista. E começar a mostrar músculos políticos para reposicionar o Palácio do Planalto.

Bolsonaro ao contrário não tem cuidado dessa estratégia. Monta somente alianças nos moldes do que já possui para governar. Os resultados do governo no Congresso foram positivos, mesmo que a custo de entregar a chave do cofre ao Centrão.

*Analista político da FSB Comunicação

 

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