Por Márcio de Freitas*

A eleição presidencial é centrípeta. Atrai a atenção da mídia, empresariado, trabalhadores e sociedade civil organizada de forma avassaladora. Nos Estados Unidos o modelo eleitoral distancia em dois anos as eleições parlamentares da escolha de quem sentará no Salão Oval, separando com parcimônia a escolha do Executivo e do Legislativo.

Os brasileiros unimos tudo, nacionalmente, mas deixamos os municípios separados. Propõe-se às vezes unificar até mesmo eleições de prefeitos. Seria um grande erro misturar os buracos de rua com eventuais furos no Tesouro Nacional. Mas democracia é isso, todos têm direito à sua preferência e gradualidade de valores.

Na vida prática, o presidente da República pode muito. Tem suas prerrogativas únicas e iniciativas exclusivas até para pautar o Congresso Nacional. Mas não pode tudo — e ainda bem que não. Aliás, pode bem pouco se não tiver apoio parlamentar, pois o ato final de deputados e senadores pode ser muito diferente da intenção do governo de plantão.

Ao editar, por exemplo, uma Medida Provisória (que tem força de lei imediata, mas necessita de aprovação do parlamento), o resultado pode ser inverso ao pretendido, ou pode ser bem diferente, no caso dos famosos jabutis.

Esta é a razão que torna muitas expectativas frustradas após a eleição. Seja para prefeito, governador ou presidente. O salvador da pátria nada pode fazer de forma isolada. E se o deixam só, pode perder até o mandato.

É estranho ver entidades empresariais, corporativos, associações civis e grupos setoriais apresentarem suas propostas e reivindicações somente aos candidatos ao Executivo, relegando as eleições proporcionais ou ao Senado (majoritárias) a um plano inferior. Realizam um debate eleitoral, entregam um documento bem diagramado a um possível presidente e depois aguardam que a coisa funcione como um passe de mágica. Quase nunca acontece como esperado.

E isso porque o Congresso sempre teve participação ativa no debate nacional, no aprimoramento ou na deformação de proposições oriundas do governo. Pode engavetar boas ideias ou esquecer no escaninho projetos ruinosos. Tudo depende da pressão que vem de fora, de várias formas. Os interesses econômicos já foram o principal fator favorável do caminhar de leis, algumas com interesses legítimos, outras com certa contaminação de viés particularíssimos, no tempo do financiamento privado de campanhas. Foram tantos escândalos que jogou-se fora a água, a bacia e a criança.

O fim do financiamento privado de campanha diminuiu muito isso, mas fechou também o parlamento a certos debates essenciais. As coisas costumam ter mais de um lado, quando não múltiplos. Os interesses ficaram muito mais fechados no próprio âmbito político, afinal os próprios parlamentares, pretensos candidatos, passaram a controlar quanto e como irão gastar em suas próprias campanhas. Ficaram com a faca, o queijo e, algumas vezes, até os 10% do garçom para disputarem as eleições.

O voto é o instrumento de pressão do cidadão sobre o candidato. Este espera uma representação condizente com a identificação retroativa que percebeu nas propostas apresentadas, no processo eleitoral. O orçamento secreto, as emendas parlamentares desviam o padrão da relação. Mais de R$ 30 bilhões nas mãos de deputados e senadores criam uma disfuncionalidade, privilegiando quem detém o mandato e a autodeterminação financeira para sua continuidade.

Se a prática dos parlamentares, implantada desde 2019/2020 no Orçamento, estiver no rumo pretendido, a eleição deste ano terá uma das menores taxas históricas de renovação na Câmara dos Deputados e no Senado Federal. É a força pura do dinheiro público com interesses políticos individuais direcionado às bases eleitorais pulverizando ações de políticas públicas sem um foco específico e reduzido a eficiência do gasto do dinheiro arrecadado pelo Fisco.

A importância de se debater o parlamento é tão grande quanto a escolha do presidente da República. Fazer uma boa escolha para um, mas deixar o escolhido nas mãos de um parlamento ineficiente, pouco produtivo e desconectado dos interesses reais do povo, pode ser o primeiro passo para o fracasso do futuro eleito.

*Márcio de Freitas é analista político da FSB Comunicação

 

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