Por Marcus Pestana*
Poucas vezes no Brasil tantas interrogações povoaram uma passagem de ano. As transições de poder, nestes 38 anos de Nova República, sempre foram tranquilas, exceto nos dois extremos temporais. O general Figueiredo se negou a passar a faixa presidencial a José Sarney, a quem chamava de traidor e pulha. Mas, certamente, o faria se o destino não nos tivesse roubado Tancredo Neves. Era uma questão mais pessoal do que institucional. De Sarney e Collor a Michel Temer e Bolsonaro, todos os mandatários cumpriram o rito republicano.
Amanhã, 1 de janeiro de 2023, uma vez mais o gesto da passagem da faixa não ocorrerá. Mas, desta vez, a questão é um pouco mais séria. Jair Bolsonaro, 38º. presidente do Brasil, optou por um silêncio sepulcral após as eleições e por uma ausência eloquente nos dois últimos meses de poder, deixando um vácuo de liderança a partir do qual brotaram iniciativas estapafúrdias de setores radicalizados do bolsonarismo, envolvendo os atos de vandalismo no dia da diplomação dos eleitos e a preparação de atos terroristas antidemocráticos. Manifestou-se apenas nessa sexta-feira (30), em uma live de despedida.
Melhor teria sido que Bolsonaro tivesse reconhecido os resultados, apesar de suas críticas ao processo eleitoral, reivindicado a liderança da oposição ao governo Lula, prometendo uma ação política oposicionista forte no Congresso Nacional e nas ruas, estimulado a participação da sua militância no PL e nas eleições municipais, mantendo a chama acesa, mas dentro das quatro linhas constitucionais.
Vamos acender uma vela e cruzar os dedos para que nenhum insano tente ofuscar a posse do novo governo com atos inspirados na cultura do ódio e do golpismo violento. As próprias lideranças institucionais do bolsonarismo deveriam renovar sua opção pelo jogo democrático e se posicionar para capitalizar um eventual fracasso do projeto liderado pelo PT, dentro do princípio da alternância do poder. O terrorismo, na história do Brasil e do mundo, só semeia pânico e o isolamento político de seus protagonistas.
Pode-se gostar ou não de Lula, mas ninguém pode negar que seja um líder político habilidoso e experiente. Nos últimos dois meses, pacificou a convivência com as Forças Armadas, baixou a temperatura do relacionamento entre os Poderes, construiu uma ampla base de apoio parlamentar. Tudo indica que haverá apenas a oposição de direita liderada por Bolsonaro e o PL, a oposição de centro democrático capitaneada pela federação PSDB/Cidadania e o relacionamento pragmático do PP de Arthur Lira e dos Republicanos.
A situação é grave e os desafios são enormes. O foco tem que ser a mais rápida possível retomada do desenvolvimento inclusivo e sustentável.
Na política monetária e cambial não temos grandes problemas. O Banco Central independente e o sistema de metas inflacionárias, por um lado, e o câmbio flutuante com reservas internacionais confortáveis, por outro, ancoram fundamentos sólidos nestas áreas. O grande “Calcanhar de Aquiles” se encontra no plano fiscal. E as decisões tomadas nas últimas semanas demonstram claramente uma baixíssima consciência do problema. Sem estabilidade econômica e confiança não haverá crescimento econômico, combate às desigualdades e políticas públicas qualificadas duradouras.
Mas que venha 2023! Vamos na onda de nosso genial octogenário baiano: “Andá com fé eu vou, que a fé não costuma faiá”. Feliz Ano Novo!
*Economista, foi deputado federal e estadual e presidente do PSDB de Minas Gerais. Também foi secretário estadual da Saúde e professor da Universidade Federal de Juiz de Fora.
Formado em Geografia pela Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN), professor da rede publica. Tenho experiência também em colégios particulares e sou especialista em Assessoria de Comunicação pela UNP.
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