Caso Arthur Lira (PP-AL) e Rodrigo Pacheco (PSD-MG) confirmem o favoritismo para continuar comandando a Câmara e o Senado, o Congresso Nacional que toma posse em 1º de fevereiro deve iniciar os trabalhos a reboque da agenda definida pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Na área econômica, o foco será a aprovação da nova âncora fiscal —em substituição ao teto de gastos— e a reforma tributária. No campo político, a análise das medidas provisórias que reestruturaram a Esplanada dos Ministérios, que pulou de 23 para 37 pastas, além da possível derrubada de vetos de Jair Bolsonaro (PL) e a discussão de propostas em resposta aos ataques golpistas de 8 de janeiro.

Líderes governistas já descartam avançar com o que chamam de “pauta de costumes da esquerda” —a expressão pauta de costumes era usado para se referir à agenda conservadora de Bolsonaro. As informações são da Folha de S.Paulo.

Ou seja, o governo e seus aliados no Congresso vão abandonar por ora assuntos que possam provocar ruído e prejudicar a agenda econômica, como a ampliação das regras do aborto legal e a inclusão na Constituição do direito ao casamento para pessoas do mesmo sexo.

Os governistas buscam também uma forma de enterrar CPIs (Comissões Parlamentares de Inquérito) que os próprios petistas e aliados defenderam para investigar os atos de 8 de janeiro. Lula já disse que uma comissão neste momento poderia terminar em uma “confusão tremenda”.

O discurso dos governistas será o de que as investigações dos ataques já estão sendo feitas pelas autoridades policiais e judiciais.

Nesse tema, há intenção do Ministério da Justiça e de integrantes da cúpula do Congresso de aprovar um pacote de medidas em resposta aos atos de vandalismo que destruíram as sedes dos três Poderes.

Como a Folha mostrou, a Justiça estuda propor ao Congresso novas punições para crimes contra o Estado Democrático de Direito, entre elas a perda de cargo público e impossibilidade de fazer concurso. Também está em avaliação a criação de novos tipos penais para quem atentar contra a vida dos chefes dos três Poderes.

Em paralelo, congressistas elaboram projetos sobre o mesmo tema. Mesmo com o apoio da cúpula, a legislatura que se inicia em fevereiro vai exigir do novo governo a construção de uma base sólida para evitar reveses em pautas cruciais.

O PT e partidos aliados pretendem, por exemplo, derrubar vetos de Bolsonaro como os dispositivos da Lei do Estado Democrático de Direito, que, na avaliação de especialistas, poderiam aumentar a punição contra quem participa de atos golpistas.

Desde que Lula foi eleito, Lira e Pacheco deram sinalizações de que ajudariam o presidente a ter governabilidade. O maior exemplo até agora ocorreu em dezembro, quando a cúpula do Legislativo ajudou a costurar a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que ampliou o teto de gastos em R$ 145 bilhões neste ano —e também autorizou outros R$ 23 bilhões em investimentos fora do limite de despesas.

Líderes do Congresso já indicaram ver com bons olhos a prioridade dada pelo ministro Fernando Haddad (Fazenda) à reforma tributária, tema discutido há décadas pelo Parlamento, mas com pouco avanço.

Na semana passada em Davos (Suíça), Haddad afirmou que, se depender do governo, a reforma tributária será votada ainda no primeiro semestre. O ministro participou do Fórum Econômico Mundial, no qual também ressaltou que pretende apresentar o arcabouço fiscal até abril. No encontro, ele disse que o ideal é chegar a um consenso entre duas PECs que tramitam no Congresso.

A PEC 45 substitui cinco tributos (PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS) por um Imposto sobre Bens e Serviços e um Imposto Seletivo sobre cigarros e bebidas alcoólicas.

Já a PEC 110 cria a CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) com fusão do PIS e Cofins, e o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços), com fusão do ICMS e ISS. Além disso, substitui o IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) por um imposto seletivo sobre itens prejudiciais à saúde e meio ambiente. Dentro da própria equipe econômica, porém, já está precificado que o texto será desidratado.

A simplificação do sistema tributário é vista dentro do PT como essencial para o desenho do novo arcabouço fiscal que vai substituir o teto de gastos.

“Eu acho que as duas teriam que andar em paralelo. Acho que para ter uma boa âncora fiscal deveria ter, primeiro, a reforma tributária”, afirma o deputado Reginaldo Lopes (MG), que ocupa a liderança do PT na Câmara até o final do mês.

Seu sucessor a partir de fevereiro, Zeca Dirceu (PR), também defende que a bancada priorize medidas já anunciadas por Lula. “Tudo que depender do Congresso para ajudar o governo a controlar a inflação, a melhorar os conceitos da economia do país, que estão muito mal. Vai ter que haver um esforço aqui, uma prioridade absoluta.”

Duas medidas provisórias podem servir como teste de fogo para medir a base inicial de sustentação de Lula 3. A primeira é a que restabelece o voto de qualidade no âmbito do Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais), que julga conflitos tributários.

Esse voto assegurava à Receita a manutenção da cobrança em caso de empate no julgamento —algo comum em disputas envolvendo grandes valores, uma vez que o tribunal é formado por representantes do Fisco e dos contribuintes. Haddad tem alertado para o aumento significativo do estoque de processos, que saltaram de R$ 600 bilhões para R$ 1,2 trilhão em quatro anos.

O fim do voto de qualidade foi decidido pelo Congresso em 2020 e alguns parlamentares já indicaram resistência à proposta do governo.

Outro teste será a medida provisória que transfere o Coaf (Conselho de Atividades Financeiras) do Banco Central para o Ministério da Fazenda, pasta à qual o órgão era vinculado antes do governo Bolsonaro.

Bolsonaro inicialmente tentou transferir o Coaf para o Ministério da Justiça, então ocupado pelo ex-juiz Sergio Moro. O Congresso, no entanto, devolveu o órgão para o Ministério da Economia. Pouco depois, o Coaf foi enviado ao Banco Central.

A MP que extinguiu a Funasa (Fundação Nacional de Saúde) também é vista como sensível. A medida provisória transferiu as atribuições do órgão para os ministérios das Cidades e da Saúde. A Funasa era cobiçada por partidos políticos por executar obras de saneamento em pequenos municípios. Há receio de que o centrão decida recriar a fundação de olho nos cargos que seriam abertos.

“A nossa prioridade de atuação, sob a orientação do presidente Lula e do ministro [Alexandre] Padilha [Relações Institucionais] é a agenda das necessidades do Brasil, restaurar os programas sociais, como Minha Casa Minha Vida e Bolsa Família, além de avançar a pauta econômica”, afirma o líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP).

O Congresso iniciará a Legislatura em 1º de fevereiro, com a posse dos novos parlamentares e a eleição para o comando das duas Casas.

A esquerda de Lula conseguiu eleger cerca de um quarto do total das cadeiras, o que levou o governo a distribuir ministérios para atrair partidos de centro e de direita, em especial PSD, MDB e União Brasil. Ainda assim, precisará de apoio de integrantes do centrão (PP, Republicanos e PL) para ter uma margem sólida de apoio.

Blog do Magno

 

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