(crédito: Caio Gomez)

Ilustração de Caio Gomez (Correio Braziliense)

Por Luiz Carlos Azedo / Correio Braziliense

A mais bem-sucedida experiência desenvolvimentista pós II Guerra Mundial foi a dos chamados Tigres Asiáticos: Coreia do Sul, Hong Kong, Cingapura e Taiwan. Governos intervencionistas protagonizaram a transformação desses países de economias estagnadas em países dinâmicos e industrializados, cada qual ocupando um papel específico na nova divisão internacional do trabalho.

Na sequência, vieram Malásia, Tailândia, Indonésia, com modelos semelhantes, e a China, que saiu do “comunismo de guerra” de Mao Tse Tung para o “capitalismo de Estado” de Deng Hsiao Ping. Hoje, é o Vietnã que envereda com sucesso por esse mesmo caminho.

CAPITALISMO DO COMPADRIO – Ao contrário do que ocorreu na Ásia, o modelo desenvolvimentista fracassou na América Latina e na África, em meio a crises políticas, muita corrupção e atraso cultural. O tratamento preferencial e protecionista dado às empresas e setores, por meio de isenções tributárias e incentivos econômicos, não produziu o mesmo resultado, porque a proteção do Estado não teve como contrapartida o desempenho.

A reprodução de modelos políticos oligárquicos e excludentes no “capitalismo de compadrio” pôs tudo a perder, inclusive no Brasil. Pode-se argumentar que o sucesso na Ásia se deve a governos autoritários, o que em parte é verdade, mas não é uma lei universal.

Aqui tivemos o auge do capitalismo de Estado durante o regime militar e o modelo fracassou. Entrou em colapso porque adensou demais as cadeias de produção sem integrá-las às cadeias globais de valor, numa economia autárquica.

HEGEMONIA DO MERCADO – O consenso econômico atual atribui ao Estado o papel de regulação da economia: “só deve intervir para corrigir falhas no sistema que a iniciativa privada sozinha não tem como resolver”.

Basta garantir que os tribunais funcionem, que os contratos sejam respeitados e o direito à propriedade protegido. A estabilidade macroeconômica deve ser considerada um valor. Ao Estado cabe cuidar da infraestrutura, da saúde e da educação dos mais pobres, “pero no mucho”. O resto o mercado resolve.

Na verdade, tudo isso foi levado em conta pelos países asiáticos. Onde está o nó? Esse é o pano de fundo da discussão sobre o novo arcabouço fiscal, que busca atender as demandas sociais com controle da dívida pública.

ARCABOUÇO FISCAL – O governo Lula se compromete a chegar a um superavit primário de 1% do PIB em 2026, seu último ano de mandato. As despesas subirão, no máximo, 2,5% ao ano, descontada a inflação. As críticas ao modelo se concentram no piso de 0,6% para o crescimento das despesas, que Haddad espera compensar com a taxa de crescimento da economia e a reforma tributária.

Bolsonaro deixou o país numa trajetória explosiva de endividamento público, que subiria de 72,9% do PIB, no ano passado, para 95,3%, em 2032. Uma alta de 22,4 pontos em 10 anos. O projeto do novo governo, no pior cenário, prevê a estabilização da dívida em 85% no mesmo período. Ou seja, 10 pontos a menos. Entretanto, se tudo der certo, a dívida se estabilizará em 77% do PIB a partir de 2025.

O que preocupa os críticos da proposta são as condições para que isso dê certo no cenário positivo, o crescimento e a arrecadação. O cenário negativo é o aumento da inflação, que ninguém deseja.

CORTE DE DESPESAS – Quem está contra o novo arcabouço fiscal defende o corte de despesas do governo, que sempre é possível, mas tem alto custo social e político. A necessidade de incluir os mais pobres no Orçamento é uma obviedade, porque foram eles que ganharam a eleição ao escolher Lula.

Sem inflação, alguém tem que pagar essa conta. São os setores privilegiados da sociedade, inclusive setores empresariais protegidos pelo Estado, sem a devida contrapartida em termos de metas de qualidade e produtividade.

Vem daí o lobby contra a proposta e pelo corte de gastos. É um conflito distributivo da renda, que tende a se acirrar durante o governo Lula, se um eficiente modelo de desenvolvimento não for posto na mesa para discussão com a sociedade. E um novo consenso econômico só será possível com mais crescimento, modernização da economia e aumento da renda das famílias.

 

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