Por Celso Rocha de Barros / Folha
O governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) parece ser capaz de ganhar com facilidade os três campeonatos mais fáceis do mundo: o troféu “Melhor que Bolsonaro”, a taça “Melhor ex-ministro do Jair” e o torneio “Melhor que o Partido Novo”.
Isso faz dele, no momento, o favorito para liderar a direita brasileira em 2026. Seria suficiente para dizer que Tarcísio de Freitas é um bom candidato, ou que seria um bom presidente?
AINDA É CEDO – Conheço gente razoável que teve boa impressão de Tarcísio quando ele ocupou cargos nos governos de Dilma Rousseff e Michel Temer. Sua relação com o governo Lula tem sido republicana, refletindo a atitude que Lula vem mantendo diante dos governadores da oposição.
Embora essa cortesia raramente seja estendida a Lula, ainda é cedo para saber se Tarcísio será um bom governador; mas sua gestão até agora foi, no geral, a que se esperaria de um administrador de direita normal, a quem não ocorreria declarar à Polícia Federal que tentou um golpe de Estado porque estava doidão.
Ou seja, se Tarcísio fosse candidato a presidente em 2018, antes de ter sido ministro de Bolsonaro, deveria ser considerado uma opção de voto perfeitamente razoável. Infelizmente, não é o caso.
MARCOU PRESENÇA – Tarcísio estava lá quando Jair matou um mínimo de 100 mil pessoas por falta de vacina, estava lá quando Jair tentou golpe de Estado. Mesmo se seus resultados como ministro tiverem sido bons — e imagino que isso será avaliado com muito mais rigor nos próximos anos — ele estava lá, andou na garupa do Jair em motociata, foi eleito por essa mesma máquina política.
Todos criticamos Lula quando ele é condescendente com Maduro ou Ortega, e criticamos com razão. Mas não se pode esquecer: depois dos últimos anos, quem tem uma reputação de democrata a reconstruir é a direita brasileira.
Em uma democracia madura, seria razoável descontar o passado de Tarcísio com Jair, já que o governador de São Paulo dá mostras de respeito às instituições. Em geral, é um bom sinal quando os melhores quadros de um movimento autoritário se convertem à democracia. E alguns elementos que compuseram o bolsonarismo, como sua organização na sociedade civil através das igrejas evangélicas, certamente sobreviverão. É melhor que isso tudo seja liderado por gente razoável.
RADICAIS À SOLTA – O problema é que não estamos nessa posição de estabilidade. Os radicais de Bolsonaro estão soltos, com mandato e participando de debates públicos como se fossem políticos normais de uma democracia. Pretendem, inclusive, acirrar o discurso golpista na CPMI do golpe.
Como se comportará Tarcísio diante dos golpistas na CPMI? Vai defender a teoria da conspiração bolsonarista dos “infiltrados do PT”? Vai se opor quando os golpistas —inclusive os com mandato— começarem a ser cassados e presos? Vai defender que o sejam? Qual será seu discurso sobre o golpe de 64? Qual será sua relação com a família Bolsonaro?
Talvez o personagem “Tarcísio moderado” seja só uma idealização, wishful thinking de ex-tucanos que têm saudade de uma direita que saiba ver hora. Se, por outro lado, o governador de São Paulo for de fato um moderado, terá que torcer para que o bolsonarismo, como movimento político, seja logo substituído por uma direita democrática. Afinal, “bolsonarismo moderado” faz tanto sentido quanto “rabino Adolf Hitler”.
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