O presidente Luiz Inácio Lula da Silva não escondeu a sua preferência para sucessão na Casa Rosada. Sem citar diretamente o ministro da Economia, Sergio Massa, ele declarou durante a semana que a Argentina precisa de alguém que “goste do Mercosul” e esse alguém não poderia ser o libertário Javier Milei, que já se posicionou publicamente contra o bloco. Apesar do apoio brasileiro, no entanto, o candidato do peronismo saiu derrotado.
O resultado de domingo, 19, é a pior derrota sofrida pelo peronismo em 40 anos de democracia e, pelo kirchnerismo, desde 2003, quando se firmou na política argentina. Mais do que a derrota de um aliado, abre questões sobre a relação entre o Brasil de Lula e a Argentina de Milei. As informações são do Estadão.
O presidente eleito da Argentina já chamou o petista de “corrupto” e, questionado em entrevista, respondeu que não se encontraria com Lula. Durante a campanha, Milei recebeu apoio do ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro e do filho Eduardo, que foi a Buenos Aires no primeiro turno.
As declarações oficiais dão a tônica: Lula desejou “sorte e êxito ao novo governo” e acrescentou que o “Brasil sempre estará à disposição para trabalhar junto com nossos irmãos argentinos”, mas não mencionou o nome do libertário. Já Bolsonaro, declarou que a “a esperança volta a brilhar na América do Sul”.
Analistas ouvidos pelo Estadão, no entanto, acreditam que o pragmatismo deve ser mais forte que a animosidade. “O Brasil olha com muita cautela a vitória de Javier Milei e deve adotar uma postura pragmática”, disse o professor de Relações Internacionais da ESPM e especialista em negócios internacionais Roberto Uebel. “É claro que, naturalmente, haverá um afastamento político capitaneado não pelo Brasil, mas pela Argentina se o Milei levar adiante (sua retórica). Mas Milei é economista, eu prefiro acreditar que ele entende a importância do Brasil, da China e do próprio Mercosul para economia argentina”, acrescenta.
O peso da troca comercial entre os dois países também foi destacado pelo professor de relações internacionais do IBMEC, Christopher Mendonça. “A relação entre Brasil e Argentina deve ter algum ruído nos próximos anos, mas isso não será inédito. Bolsonaro também não tinha tanta interlocução com o presidente (peronista) Alberto Fernández”, lembrou ele. “Mas existe a institucionalidade, os dois países são parceiros comerciais importantes e tem uma relação histórica, que certamente será preservada apesar dos eventuais ruídos entre os presidentes”, pondera.
Esses “ruídos”, afirma Mendonça, podem ser alimentados pela influência brasileira na eleição, que virou foco de discussão no último debate antes do segundo turno. A presença de marqueteiros ligados ao PT apareceu logo no primeiro bloco, quando Milei respondia às perguntas de Massa sobre economia. “Sugiro que vejam os vídeos completos e não os editados pelos brasileiros para fazer campanha negativa”, disse.
No mesmo debate, Massa acusou Milei de querer romper com os principais parceiros comerciais da Argentina, o Brasil e a China. O libertário rebateu que era “mentira” já que, na visão dele, “o Estado não deve se meter no mercado privado”, mas questionou: “que problema tem se eu falar ou deixar de falar com Lula?”
Pode citar “em entrevista ao Vodcast Dois Pontos, do Estadão, o cientista político Oliver Stuenkel destaca essa retórica de Milei contra os governos de esquerda ao apontar a vitória como um “fracasso” para o atual governo brasileiro. “Foi uma candidatura que, em parte, utilizou um sentimento anti-Brasil para se mobilizar, atacou governo americano, chinês, chileno, brasileiro… É uma forma de utilizar a política externa para mobilizar seguidores mais radicais que vai complicar, do mesmo jeito que complicou no passado no Brasil, as relações desses países”, diz ele.
Relação com o Mercosul
No meio do embate, também sobraram críticas ao Mercosul, que Milei chamou de “estorvo”. Apesar das ameaças de retirar a Argentina do bloco, o rompimento é considerado improvável porque requer aval do Congresso e o presidente eleito deve focar os seus esforços nas questões domésticas, como a grave crise econômica no país onde a inflação anual passa de 140%. No entanto, ele poderia seguir o que já faz o Uruguai, que deu sinais de afastamento no último ano, sem deixar o Mercosul. “O próprio bloco já está enfraquecido”, afirma Uebel.
É nesse contexto de esvaziamento, que o Mercosul tenta finalizar o acordo comercial com a União Europeia. A negociação que se arrasta há mais de vinte anos enfrenta resistências de ambos os lados e parece cada vez mais distante. Os governos europeus, pressionados pelo setor agrícola, cobram compromissos ambientais dos sul-americanos.
O próprio governo Lula também já expressou suas reservas e tem dito que não abre mão das compras governamentais. O impasse é que, pelo acordo, prestadores estrangeiros de bens e serviços poderão participar de licitações públicas aqui no Brasil. O governo, no entanto, considera que essas compras são uma ferramenta de fomento da economia local e quer preservar o direito de priorizar os brasileiros. Sem isso, já disse Lula, “não tem acordo”.
“Não sou otimista em relação ao acordo”, afirma Christopher Mendonça. “Os europeus são muito protecionistas, especialmente no agronegócio, que é exatamente o forte de países como Argentina e Brasil. E essa demora para conclusão do acordo pode gerar um abandono. O Paraguai já sinalizou que se o negócio não for fechado ainda este ano, vai priorizar acordos bilaterais. E o Milei pode seguir essa perspectiva e não ficar insistindo no acordo com a União Europeia”, conclui.
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Formado em Geografia pela Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN), professor da rede publica. Tenho experiência também em colégios particulares e sou especialista em Assessoria de Comunicação pela UNP.
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