Por Armando Monteiro Bisneto*

Essa é apenas mais uma demonstração do vigor da democracia dos Estados Unidos? Ou o mundo caminha para uma crise sem precedentes de representação democrática?

Trump venceu Hillary, Clinton, Obama, alguns republicanos, os atores de Hollywood, os intelectuais americanos, a mídia americana, todas as minorias, o sistema financeiro, as cidades cosmopolitas da América, os ambientalistas e a opinião pública do mundo. Venceu a tudo e a todos, levantando inclusive forte suspeição sobre analistas da grande mídia e pesquisas eleitorais. Os EUA nunca estiveram tão divididos. O mundo já havia enviado sinais preocupantes em relação a democracia e sua capacidade de responder aos desafios contemporâneos: Brexit, direita radical em crescimento na Europa, referendo das Farc na Colômbia e instabilidade na América Latina, mais notadamente na Venezuela e no Brasil.

Há que se respeitar o resultado, mesmo que não agrade. Essa é a força da democracia mais que bicentenária dos EUA que se renova a cada eleição. O país está dividido, mas não entrará em um processo de fragmentação política e social como certas repúblicas menos sólidas dessas bandas. Essa é a lição para o Brasil: encerrada a disputa, estamos no mesmo barco. Serve também de alerta sobre o que nos espera em 2018 por aqui, candidatos oportunistas, os chamados “outsiders”, de vários matizes ideológicos.

O primeiro discurso de Trump foi conciliador. A grande questão para mim é: estamos diante de um ator oportunista, que não acredita em tudo o que diz, ou de uma ameaça aos valores americanos e ao mundo? Um pragmático na economia ou um voluntarista? Só o tempo poderá responder e dissipar as incertezas do mercado, que não serão poucas. Acredito que seja um ator que soube compreender e vocalizar as frustrações profundas do seu povo. Ele compreendeu melhor do que quase todos os analistas, que preferiam idealizar uma America cosmopolita, sofisticada e globalista. Trump se apresenta como uma ameaça justamente aos fluxos de comercio global e a imigração. Ele será bastante tutelado e monitorado pelo establishment, pela burocracia, o Congresso e as Forças Armadas. A maioria formada hoje não vai esmagar os valores da minoria derrotada. Os Estados Unidos sempre encontram seu caminho; sua sociedade e suas instituições estão preparadas. A eleição de Trump parece minar a democracia, mas, na verdade, ratifica sua grandeza. Como disse Obama certa vez “Na América, qualquer um pode ser presidente”. Devemos respeitar a democracia por si mesma, posto que sempre permite correções, e não culpá-la pela eleição de candidatos que não aprovamos. Mesmo que seja Trump! Os Estados Unidos, apesar de tudo, são o grande exemplo para o mundo em termos de democracia.

No Brasil, sob pena de repetirmos algo parecido( que para nós sempre pode ser pior tanto a direita como a esquerda), devemos evitar o radicalismo político, o fenômeno do ódio político, do desrespeito às escolhas das minorias derrotadas nas eleições (ou no impeachment), o abandono dos setores socialmente mais vulneráveis, o enfraquecimento dos partidos em detrimento de grupos/famílias ou das personalidades exuberantes (como Trump) e a corrupção que mina a confiança na política em detrimento de aventureiros.

Trump não é causa e sim o sintoma de uma crise de representação democrática mundial. Onde fatores como a capacidade de escolha da população sobre temas complexos vem sendo debatida junto com o papel da mídia. Apesar de tudo, como Churchill dizia, “A democracia e a pior forma de governo excetuando todas as outras”.

*Advogado e bacharel em Ciências Contábeis. Especialista em Direito Tributário e em Relações Institucionais e Governamentais