O contraste fica cada vez mais evidente. De um lado, uma tradição de oito anos de pacífica e ostensiva convivência com a malversação de recursos públicos, escorada nos ombros largos da governabilidade. De outro, uma completa devassa no Ministério dos Transportes, provocada pelas recentes denúncias de irregularidades praticadas desde que aquela pasta se transformou, no governo petista, em feudo do Partido da República (PR), componente da base aliada. “Sairão todos, independentemente de endereços partidários”, garantiu a presidente Dilma Rousseff em entrevista de 80 minutos concedida a cinco jornalistas na última sexta-feira, no Palácio do Planalto.

Dito e feito. Até o início desta semana eram 18 os demitidos, entre eles o ministro herdado do governo anterior e os diretores dos dois principais órgãos vinculados à pasta, o Dnit e a Valec, responsáveis, respectivamente, pelas infraestruturas rodoviária e ferroviária. Dessas demissões, talvez mais significativa até do que a do próprio ministro Alfredo Nascimento foi a do diretor de operações do Dnit, Luiz Antonio Pagot, que resistiu à saída por quase três semanas, apelando para o recurso de entrar em férias e fazer ameaças veladas ao governo – tudo isso com o apoio explícito de importantes dirigentes petistas, entre eles o fiel escudeiro de Lula, Gilberto Carvalho, devidamente plantado no Planalto como ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência, o líder do governo na Câmara, deputado Cândido Vaccarezza, e, de quebra, o vice-presidente da República e presidente de honra do PMDB, Michel Temer.

Apesar de algumas indecisões e recuos diante das crises políticas que tem enfrentado nos seus primeiros seis meses de governo – todas elas alimentadas por suspeitas e denúncias de corrupção -, a serena determinação demonstrada por Dilma Rousseff na conversa com os jornalistas que recebeu na sede do governo indica que, se depender apenas dela, o mau hábito de passar a mão na cabeça de corruptos e “aloprados”, bem como tentar transferir para a oposição e a imprensa a responsabilidade por todos os malfeitos, faz parte do passado.