Artigo: Seca, o que está ruim pode ficar pior

 

A seca é um fenômeno climático velho conhecido nosso. Ela é tão certa quanto à morte e quando ocorre com tanta intensidade como agora, a morte dos animais é uma certeza. A seca tem provocado até transtornos comportamentais em alguns criadores, a ponto de fazê-los perder a cabeça e cometer suicídio diante da impotência de não mais poder fazer nada pelo seu rebanho; após extinta todas as reservas alimentares e os recursos financeiros, associado à (in)certeza do futuro. Não é raro ouvirmos relatos de casos desse tipo na nossa região, infelizmente.

Essa tragédia secular é anunciada há muito tempo e não dá mais para jogar “cara ou coroa” ou “palitinhos” a fim de saber se ela irá ocorrer de ano em ano, de dois em dois, ou de dez em dez. O certo é que, volta e meia, lá vem ela novamente, e cada vez mais desastrosa, encontrando-nos sempre despreparados para a sua recepção. Os governantes das três esferas do poder público sabem muito bem disso. O problema é que, ao contrário do que apregoam, preferem tratar a questão com paliativos; reagem tardiamente quando da ocorrência de estiagens prolongadas, quando na verdade deviam agir antecipadamente. Qualquer leigo sabe que curar é sempre mais dispendioso e custoso do que prevenir.

O quadro que ora se configura tende a virar o refrão da perua, “é de pior a pior”. Não há nenhuma previsão de chuvas alentadoras em curto prazo, a não ser que a natureza resolva desbancar os meteorologistas, perdoar as agressões sofridas pela ação do homem e dar um fim nessa seca causticante. Mesmo acreditando nos prognósticos dos meteorologistas, o sertanejo ainda se apega a um fio de esperança na crença de que, até o dia de São José, o céu possa derramar bênçãos em forma d’água.

Se o dia 19 transcorrer sem sinais de chuvas, certamente assistiremos a um desbaste de animais de grande e pequeno porte, pois o que se ouve em reuniões de agricultores e produtores rurais e em conversas rotineiras é que não haverá mais condição nenhuma de manter pelo menos a “semente” da criação, uma vez que não se tem mais nada para alimentar os animais no campo. Encontramos ainda alguma vegetação na copa das árvores, onde os animais não conseguem alcançar por mais insistente que sejam. Embaixo, só se ver o pó fino pisado e repisado nos “carreiros de bode”.

Enquanto esse quadro desolador vai se complicando e os animais com os dias contados, seja pela iminência da morte por fome e sede ou sangrado pelas facas afiadas e pontiagudas dos marchantes e atravessadores, aproveitadores da situação, o tema recorrente na mídia é eleição.

Fala-se tanto em 2014 – não em inverno, fartura e bonança – mas em quem vai ser candidato a presidente do nosso país cheio de desigualdades. Parece que essa discussão fora de época é usada com a finalidade de desviar a atenção para o grave problema social e econômico que o Nordeste está vivendo. Para os que só têm sede e fome de poder, até que a seca é “benfazeja”: gera dividendos eleitorais e alimenta uma grande “indústria”.

Afinal, “não é só falar de seca. Não tem só seca no Sertão”.

 Paulo Robério Rafael Marques/Professor