Por Ricardo Boechat – ISTOÉ

É perda de tempo rememorar as inúmeras tentativas levadas a cabo nos últimos três anos com o objetivo de melar a Lava Jato. Foram e continuam sendo tantas que boa parte dos cidadãos já reage a elas sob o efeito anestésico produzido por manchetes que se repetem indefinidamente, perdendo capacidade de chocar, por mais escandalosos que sejam os fatos expostos.

Também não deve surpreender a diversidade de conspiradores, uma galera que inclui, em diversos níveis de envolvimento e discurso, presidentes, ex-presidentes, ministros, governadores, magistrados, juristas, partidos e, claro, políticos. Sendo tão articulada e poderosa essa frente ampla, tudo que a “República de Curitiba” não precisa é cometer erros que os fortaleça.

Moro, Dallagnol & seus Blue Caps, como é notório, fizeram movimentos que pareceram inspirados por seus inimigos. Da condução coercitiva de Lula à divulgação de grampos de Dilma; da coletiva do “power point” à prisão hospitalar de Guido Mantega, os erros de ação ou comunicação mais deram trunfos aos adversários do que fizeram avançar as investigações.

O juiz e os procuradores federais sabem o quanto de minas estão enterradas onde pisam e saltitar no terreno – prendendo blogueiros por causa de furos jornalísticos, por exemplo – é o menos recomendável.

Só os mal intencionados (ou comprometidos) negam o saldo altamente positivo que a Lava Jato acumula até aqui, mas a herança que vai deixar ainda depende de muitos capítulos a serem encenados em palcos onde os mocinhos nem sempre vencem.

Os ensaios mostram que os vilões da trama estão cada vez mais unidos e ousados, costurando a anulação de provas “licitamente obtidas mas criminosamente divulgadas” e blindagens legais aos suspeitos.

Num ambiente desses, ter cautela (não confundir com temor) é questão de vida ou morte, pois qualquer vacilo pode ser fatal. Basta ver o quanto cresceram os ataques à Lava Jato, nos últimos dias, a partir da barulhenta Carne Fraca.

O delegado Moscardi Grillo expôs um gravíssimo esquema de corrupção juntando frigoríficos, parlamentares e alguns fiscais do Ministério da Agricultura, mas o tsunami provocado pela espalhafatosa divulgação da “maior operação de todos os tempos da Polícia Federal” está fazendo a alegria dos que sempre surfaram nas ondas da impunidade.