Por Adriano Oliveira*

Após a vitória do PT na eleição presidencial, afirmei que a desbolsonarização da política brasileira acontecerá. Tal hipótese advém de dois cenários/possibilidades que considero para o governo Lula: 1) Desempenho da economia de regular para bom; 2) Desempenho da economia de bom para excelente. Em ambos os cenários, o ex-presidente da República sofre de razoável para forte enfraquecimento eleitoral e outras lideranças políticas no âmbito da direita surgem, como Romeu Zema e Tarcísio de Freitas.

Jair Bolsonaro voltou ao Brasil. Aqui ele seguirá provocando paixões, afinal, o bolsonarismo é fenômeno moral e ideológico. Todavia, na política, antes da paixão (o deve ser), deve estar o olhar atento e profundo para a realidade. O ex-mandatário da República terá capacidade de fazer oposição ao governo do PT? Prevejo que não. O histórico de Bolsonaro sustenta esta minha premissa. Ele não é forjado ao diálogo, ao debate e tem precária visão de País. O retorno do ex-presidente à presidência da República só acontecerá caso a argentinização da economia brasileira ocorrer. Cenário remoto.

Bolsonaro surgiu em ambiente de intensas crises política e econômica provocada, em grande parte, pela operação Lava Jato. Ele representou o novo, a esperança contra os desmandos do PT. No ambiente da eleição de 2018 estava presente o antipetismo e ausente Lula. Se Lula tivesse disputado a eleição, Bolsonaro teria sido eleito presidente? O resultado da última eleição presidencial sugere que a disputa teria sido acirrada.

Sem crises, Jair Bolsonaro tem dificuldade de sobreviver. As crises representam o oxigênio do bolsonarismo. Portanto, a lógica e a previsão são bem simples: caso o governo Lula não conviva com intensas crises política e econômica, o bolsonarismo será desbolsonarizado e enfraquecido. Porém, a ausência dele não representará a inexistência de oposição ao PT. Ela existirá, mas civilizadamente e com novos atores.

A aposta no caos foi o grande equívoco de Jair Bolsonaro quando presidente da República. A pandemia não deve ser encarada como variável que enfraqueceu as chances de Bolsonaro ser reeleito. Ao contrário. Ela foi a grande oportunidade de Bolsonaro. Se, durante a pandemia, o então presidente tivesse optado por radicalizar as políticas sociais, criando auxílios financeiros robustos para os votantes de maior renda, e levando saúde, educação e habitação para eles, o lulismo teria sido enfraquecido. Inclusive, na região Nordeste. Bolsonaro, em razão da sua capenga visão de mundo, fez a opção de ser negacionista e de interromper o auxílio emergencial. Às vésperas da eleição, foi que Bolsonaro priorizou os pobres. Mas já era tarde!

Quem elegeu Lula em 2022 foram os pobres e o Nordeste. Pesquisa do Datafolha (30/03/2023) revela que: 1) 38% dos eleitores aprovam (Ótimo/bom) o governo Lula; 2) 29% reprovam (Ruim/péssimo); e 3) 30% definem como Regular. No Nordeste, 53% aprovam a gestão Lula. E entre os eleitores de menor renda, são 21% que o reprovam. Desde 2002, as pesquisas mostram que os nordestinos e os eleitores com menor renda são os sustentáculos do lulismo. Portanto, se Lula seguir privilegiando os pobres, as chances para Jair Bolsonaro voltar é reduzida.

Os que apostam no ex-presidente da República cometem erro estratégico e revelam que a miopia guia as suas escolhas. Explico! O Brasil não está rachado. A citada pesquisa Datafolha revela que 29% dos eleitores reprovam o governo Lula. Pesquisa do referido instituto divulgada em dezembro de 2022 mostrou que 25% dos brasileiros declaram-se bolsonaristas. Então, os que reprovam Lula hoje são, supostamente, bolsonaristas no todo. Entretanto, neste instante, 30% classificam o governo Lula como regular. Os votantes que optam por esta opção são líquidos, isto é, podem ir para o aprova ou desaprova, a depender das circunstâncias. Se a economia for bem, eles tendem a ingressar no universo dos aprovam. Se for mal, no universo dos que reprovam.

Hoje existem 30% de votantes volúveis mais 38% que aprovam Lula. Conclusão: 68% dos eleitores não são bolsonaristas. Apesar de que neste universo, 30% podem vir a ser “bolsonaristas” caso o governo Lula não seja exitoso na economia. Conclusão: o Brasil não está rachado, apesar da força do bolsonarismo.

Ressalto, ainda, que em breve futuro, os 30% que hoje classificam o governo Lula como regular podem optar por outros líderes da direita, como Tarcísio de Freitas. E os evangélicos, os quais são eleitores importantes e estratégicos, e que são, ainda, sustentáculos do bolsonarismo, poderão ser suscetíveis aos efeitos do desempenho econômico positivo da era Lula caso ocorra; ou façam a opção por outras lideranças em razão da incapacidade de Bolsonaro de liderar em um ambiente sem crises. Conclusão: Bolsonaro só volta se a tragédia econômica ocorrer ou um cisne negro aparecer.

*Doutor em Ciência Política. Professor da UFPE. Fundador da Cenário Inteligência