Charge do Zé Dassilva: Orçamento secreto - NSC Total

Charge do Zé Dassilva (NSC Total)

Por Carlos Andreazza / O Globo

A manchete de um grande jornal informou: “Governo Lula abre mão de verba para Lira distribuir emendas até a deputados de oposição”. Poderia ter simplificado: “Orçamento secreto continua”. Talvez pusesse uma pimenta: “Novo governo mantém prática do antigo”. Quem sabe dando nome aos bois: “Governo Lula dá sequência a esquema de Bolsonaro”. (E, então, o jornal seria cancelado. Como ousou equivaler o garantidor da democracia ao capiroto?)

Nada mudou, afinal. (Calma. Nada mudou em matéria de orçamento secreto.) Sufocada a rubrica RP9, que classifica a emenda do relator, a gestão autoritária do orçamento da União driblou o Supremo e migrou à RP2, mantida a falsa administração dos recursos pelos ministérios.

NOVAS FACHADAS – O orçamento era secreto porque movido por detrás de fachadas. As fachadas se deslocaram — para que o trânsito orçamentário permaneça na mão obscura de poucos senhores.

Lembro que a Lei Orçamentária Anual de 2023 veda o cancelamento — sem o aval do relator-geral — de dotações de despesas discricionárias que decorram de indicações do… relator-geral. Ficou tudo amarrado, conforme distribuição dos bilhões definida — sob indicação do relator — quando ainda vigorava o uso pervertido das emendas… do relator.

Não é, portanto, que Lula tenha aberto mão de verba para Arthur Lira distribuir até a deputados de oposição. O governo simplesmente não tem o que fazer. Longe, porém, de ser vítima.

ACERTO NA TRANSIÇÃO – A forma como os dinheiros do orçamento secreto — como os usos desses dinheiros — foram remanejados-recompostos derivou de acordo que desamarrou a aprovação da PEC da Transição. Lira e sócios mandam o Planalto pagar — e o Planalto paga. Daí por que contemplados também — como na época das emendas do relator — parlamentares de oposição.

Não por gentileza de Lula. Mas porque Lira e o consórcio que lidera querem, em nome de interesses corporativistas. Ao governo cabendo controlar, em troca de votos nas matérias de seu interesse, o tempo das liberações. Ficam todos felizes, todos comprometidos entre si.

Nada mudou. É preciso avaliar a natureza dessa continuação de práticas. É preciso também avaliar o uso do discurso de “não criminalização da política” como fachada para que avanços patrimonialistas sobre a superfície do Estado se perpetuem.

JOGO VICIOSO – Governos democráticos oferecem espaços na administração para que aliados participem da gestão. É do jogo. No entanto que jogo fazem governos democráticos que oferecem espaços na administração para que aliados pretendidos continuem gerindo viciosamente as mesmas superfícies corrompidas durante o período que o discurso democrático afirma querer superar?

O problema não está em dividir cargos — em partilhar o poder. Está em sustentar o esquema de poder lesivo que vigorou no governo Bolsonaro. O que significará Juscelino Filho ser ministro de Lula, senão o reconhecimento — o elogio — à capacidade de o orçamento secreto eleger novos poderosos?

Nada mudou. Veja-se o caso da Codevasf. É propriedade, desde o governo Bolsonaro, do deputado Elmar Nascimento. E assim permanecerá; a Elmar cabendo decidir se manterá o atual presidente da companhia, cujo alargamento fez com que os vales do São Francisco e do Parnaíba chegassem até o Amapá do rio Alcolumbre, esse grande afluente.

ORÇAMENTO SECRETO – A Codevasf de Elmar, que é Lira, foi — sob Bolsonaro — a arena preferencial para o espetáculo do orçamento secreto. Assim seguirá. Seguirão as irregularidades? Seguirão as irregularidades identificadas no governo Bolsonaro, mantida a mesma cadeia de comando na empresa? Poderá ser diferente?

Apurações da Controladoria-Geral da União documentaram a transformação da companhia em fábrica de pavimentação Brasil adentro, com asfalto que esfarela como farinha. Mesmo no Amapá. É um complexo perfeito de interesses alcolúmbricos.

A Codevasf, musa do orçamento secreto, fica com Elmar, que é Lira, em troca do apoio do União Brasil, que apoia ninguém — e quer mais sudenes. Que tal? Não haverá miragem maior que esperar o apoio de um partido que não existe, mas tem votos. Uma máquina de barganha — ou chantagem.

PARTIDOS-PERSONAS – O União Brasil é uma federação de partidos-personas. Elmar é um. Davi Alcolumbre, um. Luciano Bivar, outro. Há outros. O governo entrega, entrega pavimentação, pensa se acercar do oásis, mas o deserto come o asfalto e pede mais e mais chão — mais areia. O governo entrega. O União, farinha, escapa entre os dedos, a cada votação demandando um novo Dnocs. Vale?

Não é somente investimento corruptivo, autoritário e caro. Mas corruptivo, autoritário, caro e inócuo. Areia — farinha — não faz base. A grande questão, contudo, impõe-se mesmo à burrice da escolha contraproducente: se Bolsonaro, o sete-peles, entregou as codevasfs aos cuidados do consórcio Lira, em que página ficará o governo Lula ao manter os vales sob controle da República de Elmar?

Criticado por Luiz Inácio Lula da Silva (PT) durante a campanha eleitoral, o Orçamento Secreto ficou de fora da pauta das primeiras reuniões da cúpula do governo eleito. Durante a reunião com o relator-geral do Orçamento, Marcelo Castro (MDB-PI), comandada pelo coordenador da Transição, o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB), e pelo senador eleito Wellington Dias (PT-PI), o tema sequer foi tratado.

De acordo com a cúpula petista, não é momento para tratar das chamadas emendas de relator (RP-9), pois a prioridade das primeiras reuniões é de acertar as tratativas para a transição e focar em propostas para garantir o “Bolsa Família” (Auxílio Brasil) de R$ 600, com acréscimo de R$ 150 para famílias com crianças de até seis anos, além de reforçar investimentos em áreas como saúde, educação e infraestrutura. As informações são do Correio Braziliense.

“Nós não tratamos de RP-9. Esse assunto será tratado no momento oportuno pelos presidentes das Casas pelo líder da bancada. Não é um assunto para ser discutido de forma inicial com o relator do orçamento. É um tema bem mais amplo e envolve uma série de questões políticas e será tratado prioritariamente com os presidentes da Câmara e do Senado e depois, mais adiante, à medida que este debate evoluir, se precisar uma readequação orçamentária, ela será feita no momento oportuno. Nós tratamos exclusivamente da PEC”, disse o deputado federal Paulo Pimenta (PT-RS) após a reunião.

Com tantas articulações por ajustar, mexer no Orçamento Secreto pode complicar ainda mais a missão de conseguir governabilidade em um Congresso que terá, tanto na Câmara, como no Senado, enormes bancadas com perfis mais à direita e conservador. Após a eleição de Lula, a intenção de acabar com as RP-9 deve ser a primeira promessa de campanha a ficar pelo caminho. Interlocutores garantem que os R$ 20 bilhões vão permanecer e o próprio Marcelo Castro disse que propor a retirada do Orçamento é perda de tempo, pois “não tem chance nenhuma de ser aprovada”.

Via Congresso, a única alteração ainda no radar, é de aparecer o nome do parlamentar que indicou as emendas, mas também não está nos planos imediatos. Atualmente, todas as emendas recebem a rubrica do relator-geral do Orçamento. O único jeito do Orçamento Secreto acabar sem criar estresse para a cúpula do governo eleito é o Supremo Tribunal Federal julgar nas próximas semanas uma ação pendente sobre o tema e declarar as emendas do relator como inconstitucionais. Caso isso ocorra, as estratégias em torno da busca por apoio serão modificadas para todos os lados.

Composição

A federação PT/PCdoB/PV elegeu a segunda maior bancada da Câmara com 80 deputados federais. Apesar da eleição expressiva, os partidos participantes da Coligação Brasil da Esperança, como PSB, PSol e Avante, além do PDT — que teve a candidatura de Ciro Gomes — não acompanharam a crescente petista, e, juntos, somam 59 parlamentares na Câmara. Somado ao PT, a bancada esquerdista tem 139 deputados.

Mesmo que o governo eleito consiga apoio de MDB, PSD e União Brasil, que somam 143 deputados federais, o que daria ao governo Lula maioria dentro da Casa, o número chegaria a 282 parlamentares. No entanto, como pode haver dissidências dentro dos partidos, e o PT vai precisar de mais apoio para aprovar propostas com quórum qualificado, mexer no Orçamento Secreto trará incômodo, principalmente, aos partidos do Centrão, o PL, o PP e o Republicanos.

O partido do presidente Jair Bolsonaro, o PL, elegeu 99 deputados federais, e junto a PP e Republicanos, tem uma bancada de 187 parlamentares, a maioria com perfil mais à direita e conservador. Portanto, é essencial para Lula conseguir algum apoio dessas legendas, mesmo com a rejeição de importantes nomes dentro da cúpula de aliados, como o senador Renan Calheiros (MDB-AL).

A tendência é do governo eleito buscar apoio das legendas que hoje estão em torno de Bolsonaro. Na mesma hora da reunião de Alckmin com Marcelo Castro, o vice-presidente do PT, deputado federal José Guimarães (CE), se reuniu com Arthur Lira (PP-AL), e revelou que o presidente da Câmara “abriu as portas” para negociar com o novo governo e que “topa ajudar” na tramitação de propostas, como a PEC da Transição.

Além disso, Lula e o presidente do PL, Valdemar da Costa Neto, devem se reunir em Brasília na próxima semana, quando o petista voltar de viagem da Bahia em descanso após a campanha. Estaria na mesa de negociações um acordo para o governo apoiar um nome do PL à presidência do Senado daqui a dois anos.

Na próxima eleição dentro da Casa, a tendência é que Rodrigo Pacheco (PSD-MG) seja reconduzido.

Com tantas peças no jogo de tabuleiro querendo negociar cargos e principalmente apoio para a presidência da Câmara, tirar quase R$ 20 bilhões das mãos do Congresso poderia gerar um mal-estar na relação com legendas de forte poder de decisão na indicação dessas verbas da RP-9, especialmente com os 187 deputados de PL, PP, Republicanos.

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