Foto: MDAS/Divulgação

Os arranjos familiares formados por um único membro (chamados de unipessoais) estão na mira do pente-fino nos cadastros do Bolsa Família. Dos 5 milhões de beneficiários que declararam morar sozinhos, 900 mil já foram excluídos do programa, por estarem com registro irregular. A revisão tem o objetivo de garantir que os recursos cheguem a quem mais precisa.

Esse tipo de composição familiar, que representava 15% das pessoas com direito aos benefícios do PBF (Programa Bolsa Família), aumentou para 27% durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), sob o nome Auxílio Brasil.

Segundo o TCU (Tribunal de Contas da União), em 2022, pelo menos 22% do total de beneficiários desse auxílio eram famílias com um único membro. O tribunal e o MDS (Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome) consideraram o aumento de arranjos unipessoais, de 73%, fora da curva e do vínculo com a dinâmica demográfica das famílias brasileiras entre o fim de 2021 e os últimos meses de 2022, o que levantou suspeitas de que algumas pessoas pudessem ter mentido em seu cadastro.

Os dados dos beneficiários do Bolsa Família e de mais 30 programas sociais ficam reunidos no sistema do Cadastro Único, que passou por atualização no primeiro semestre. Com base nessas informações, o ministério deu início à Averiguação Cadastral, que inclui a verificação da composição familiar, principalmente dos arranjos unipessoais, tarefa que deve ser realizada até dezembro e é efetuada pelos municípios.

Tudo o que está arquivado no Cadastro Único é processado mensalmente pelo Sibec (Sistema de Benefícios ao Cidadão), administrado pela CEF (Caixa Econômica Federal), que faz a análise automática da elegibilidade, habilitação e seleção de famílias no PBF, além de aprovar a concessão e as ações de administração do benefício.

Como funciona a revisão dos cadastros?

A Averiguação Cadastral de composição familiar tratou, entre março e junho de 2023, cerca de 45% das informações de 42 milhões de famílias que receberam o Auxílio Brasil em janeiro de 2022. A previsão do MDS é chegar a 60% da base de dados até o fim do ano.

As análises englobam 8,2 milhões de registros, dos quais 5 milhões se referem a beneficiários do Bolsa Família. A partir do mês de setembro, os municípios terão um limite de 16% de arranjos unipessoais na folha de pagamento do Bolsa Família.

O ministério afirma que a verificação é realizada de forma gradativa e incremental, para evitar o bloqueio ou o cancelamento de benefícios de famílias que são, de fato, unipessoais, o que acabaria penalizando injustamente os mais pobres.

R7

Por Alon Feuerwerker*

Talvez as despesas com programas sociais, o Auxílio Brasil/Bolsa Família de carro-chefe, possam ser classificadas como “investimento” no plano retórico. Mas no universo das realidades materiais elas nunca deixarão de ser gastos de custeio. Talvez faça sentido politicamente deixar para sempre certas despesas de custeio fora do limite imposto pelo teto constitucional de dispêndios. Pelo ângulo da economia, não. Se for para liberar desse limite alguma rubrica, melhor que seja investimento, pois este alavanca o mais eficiente programa social de todos: o emprego.

Seria, entretanto, quixotismo puro olhar a política pelas lentes de uma racionalidade fria, pois os políticos são em larga medida escravos dos grandes movimentos de opinião. E há consenso sobre a necessidade de continuar pagando os R$ 600 às mais de 21 milhões de famílias hoje cadastradas para receber o benefício. Então é provável que o Parlamento escolha o caminho mais fácil, em vez de enveredar pelo pântano de tentar cortar outras despesas de custeio para conseguir encaixar essa não tão nova.

O que facilitaria, quem sabe?, abrir um buraco no teto de gastos para os investimentos.

No final do arco-íris alguma solução será encontrada, pois interessa a todo o mundo político achá-la. Mesmo que venha a ser uma gambiarra.

De gambiarra em gambiarra o teto de gastos agoniza, e já faz algum tempo. Talvez valesse a pena aproveitar o renovado (está sendo assim desde 2020) consenso sobre a necessidade de furá-lo e buscar uma alternativa. Ou alternativa nenhuma e simplesmente revogá-lo, adotando a fórmula minimalista mais razoável: o Executivo pede ao Legislativo autorização para fazer certa despesa, e este decide se autoriza ou não. E diz de onde virá o dinheiro. Seria um cipoal a menos para desembaraçar.

Melhor do que persistir neste faz-de-conta, em que o teto de gastos está previsto na Constituição e a cada ano é preciso emendar a Constituição para desrespeitá-la. Ionesco puro.

Ainda sobre incongruências, uma é candidata a destaque. No debate sobre os recursos para manter programas sociais vitais, o verbo tem sido exatamente este: manter. Não se fala em ampliar.

Mas isso bate de frente com um dos pilares da narrativa vitoriosa na campanha eleitoral.

Pois se estabeleceu entre nós como verdade, a partir de um único estudo, que 33 milhões de pessoas passam fome no Brasil, apesar dos R$ 600 mensais dados às 21 milhões de famílias do AB/BF. No último debate do 2º turno, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) procurou contornar esse ruído, associando a fome à recente reforma da Previdência. Duvidoso.

Ora, se 33 milhões de pessoas passam fome apesar de 21 milhões de famílias receberem R$ 600 por mês, uma de três situações é obrigatoriamente verdadeira: 1) o valor pago é insuficiente, precisa ser aumentado; ou 2) há 33 milhões de muito pobres fora do Auxílio Brasil/Bolsa Família; ou 3) há uma combinação dessas duas situações. De todo modo, a ser verdadeira a premissa, estaríamos diante de uma gravíssima emergência social. Que exigiria um plano imediato e recursos imediatos para ser enfrentada.

Mas não se vê nenhuma preocupação ou movimentação nesse sentido. Todo o debate gira simplesmente em torno de por quanto tempo prorrogar o que já existe. Ninguém fala em aumentar as famílias no programa ou aumentar o valor do benefício.

Nada como recorrer ao manjado reductio ad absurdum. Nunca falha.

*Jornalista e analista político e de comunicação na FSB Comunicação.

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